Redação Pragmatismo
ELEIÇÕES 2022 21/Jul/2022 às 10:41 COMENTÁRIOS
ELEIÇÕES 2022

Todo mundo tem uma teoria sobre a morte do diretor da Caixa Econômica

Publicado em 21 Jul, 2022 às 10h41

As causas das mortes do diretor da Caixa em Brasília e do funcionário da Itaipu no Paraná ainda são investigadas, mas dão ainda mais tragicidade a histórias já suficientemente trágicas. Em momentos de comoção, teses sobre queima de arquivo circulam como rastilhos de pólvora pelas redes para lembrar da morte em condições misteriosas de outros ex-aliados incômodos ao ciclo presidencial, como Gustavo Bebianno e Adriano da Nóbrega

queima de arquivo diretor caixa
Em cima: Sergio Ricardo Faustino Batista e Claudinei Coco Esquartini. Em baixo: Adriano da Nóbrega e Gustavo Bebianno

Matheus Pichonelli, Splash

O diretor de Controles Internos e Integridade da Caixa, Sérgio Ricardo Faustino Batista, foi encontrado morto, na noite de terça-feira (19), na parte externa do edifício-sede do banco, em Brasília. A polícia trabalha com a hipótese de que ele tenha cometido suicídio.

O caso acontece poucos dias após vir a público uma série de denúncias de assédio sexual praticadas pela direção da Caixa contra mulheres na instituição. Na mesma semana, uma associação de funcionários do banco ingressou com uma ação coletiva contra a Caixa por assédio moral. As vítimas alegam que o modelo de gestão do banco fez explodir os casos de transtorno de ansiedade, depressão e burnout.

Batista era responsável justamente pela área que recebe denúncias do tipo. Nas redes sociais, a notícia gerou alvoroço. Não faltou quem apontasse a morte do diretor como “queima de arquivo”.

A hipótese dos detetives das vias digitais era que ele havia sido “suicidado” — neologismo que designa uma tentativa de mudar a cena do crime para simular uma morte autoprovocada.

A mesma hipótese surgiu após a divulgação da notícia de que um vigilante de Itaipu havia se matado, em uma cidade do interior do Paraná, pouco depois do assassinato de um militante petista em seu aniversário em Foz do Iguaçu (PR). Claudinei Coco Esquarcini, o vigilante, era diretor da associação onde aconteceu o crime e encarregado pela instalação das câmeras de segurança do local.

Uma das suspeitas da polícia é a de que o assassino, Jorge José da Rocha Guaranho, se enfureceu ao ter acesso às imagens da festa, com decorações em homenagem a Lula e o PT, quando estava em um churrasco com amigos. Guaranho era bolsonarista e entrou no salão atirando. Esquarcini era um dos poucos que tinham a senha do sistema de monitoramento.

Para os detetives das redes, os detalhes que ele poderia revelar ao longo das investigações só endossam a hipótese de que ele precisou ser “suicidado” para não abrir o bico.

As causas das mortes em Brasília e no Paraná ainda são investigadas, mas dão ainda mais tragicidade a histórias já suficientemente trágicas.

Apenas pessoas próximas a Batista e Esquarcini podem dizer que tipo de contexto íntimo poderia ter levado a um possível quadro depressivo e de que forma os eventos em que se viram envolvidos podem ter agravado a situação. Estamos, afinal, em um país que enfrenta uma epidemia de transtornos mentais em meio a uma pandemia.

Não seria pouco plausível imaginar que a carga de sofrimento de familiares e das vítimas dos observada por quem poderia evitar o pior tenha resultado em um processo de culpa ou tristeza.

Nas redes, porém, muitas pessoas, entre elas gente esclarecida, não pensou duas vezes em lançar suspeitas que confirmam apenas um viés de informação.

As manifestações são sintomas do descrédito em que o país e suas instituições foram lançadas de uns tempos para cá. Um país onde o próprio presidente faz questão de colocar o processo eleitoral que nem sequer aconteceu sob suspeita e que corre para descredenciar o inquérito da Polícia Federal que descartou o envolvimento de outras pessoas no atentado a faca sofrido por ele em um ato de campanha em Juiz de Fora (MG).

Em momentos de comoção, como agora, teses sobre “queima de arquivo” circulam como rastilhos de pólvora pelas redes para lembrar da morte em condições misteriosas de outros ex-aliados incômodos ao ciclo presidencial, como Gustavo Bebianno e Adriano da Nóbrega. O primeiro, ex-braço direito da campanha e secretário de governo, morreu após passar mal durante um jantar; o outro, apontado como chefe de uma milícia no Rio e próximo do clã Bolsonaro, foi executado pela polícia na Bahia, onde estava foragido. Não é exagero dizer que levou para o túmulo muitos segredos.

VEJA TAMBÉM: A morte de Gustavo Bebianno e as técnicas de assassinato simulado em ataque cardíaco

No país que substituiu bibliotecas por clubes de tiro, a bala passou a ser o elemento central de mediação de conflitos. O caminho tem sido bem pavimentado por discursos de ódio e todo tipo de teorias da conspiração.

Não importa de que lado estamos: o inimigo está sempre à espreita — e muitas vezes é enunciado até mesmo por grupos progressistas que veem um invisível ceifador de vidas em todo canto onde os interesses presidenciais se chocam com um possível denunciante.

Tanta desconfiança de tudo e de todos tem seus efeitos rebotes e contraditórios. O país que acredita em messias já não confia em ninguém. O país que se move pela fé está cada vez mais descrente das versões oficiais. Pudera. A paranoia hoje é quase uma instituição nacional.

→ SE VOCÊ CHEGOU ATÉ AQUI… considere ajudar o Pragmatismo a continuar com o trabalho que realiza há 13 anos, alcançando milhões de pessoas. O nosso jornalismo sempre incomodou muita gente, mas as tentativas de silenciamento se tornaram maiores a partir da chegada de Jair Bolsonaro ao poder. Hoje somos alvo de ameaças por pessoas que ocupam cargos eletivos e também sofremos frequentemente assédio judicial. Por isso, nunca fez tanto sentido pedir o seu apoio. Qualquer contribuição é importante e ajuda a manter a equipe, a estrutura e a liberdade de expressão. Clique aqui e apoie!

Recomendações

COMENTÁRIOS