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Direita 29/Jan/2021 às 09:00 COMENTÁRIOS
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Bolsonaro pretende substituir Trump como líder mundial da extrema-direita

Publicado em 29 Jan, 2021 às 09h00

Parece piada, mas não é. Na ausência de Trump, Jair Bolsonaro irá assumir o papel de liderar a aliança internacional ultraconservadora. A informação faz parte de um e-mail enviado a colaboradores por Valerie Huber, ex-integrante do governo Trump

Bolsonaro substituir Trump líder mundial da extrema-direita
(Imagem: Alan Santos | PR)

Jamil Chade, em seu blog

O governo de Jair Bolsonaro irá assumir o papel de liderar a aliança internacional ultraconservadora, na ausência de Donald Trump. A informação faz parte de um e-mail enviado a colaboradores por Valerie Huber, a pessoa escolhida pela Casa Branca no governo do presidente republicano para tratar de temas de saúde da mulher.

Numa ordem executiva assinada pelo presidente Joe Biden na quinta-feira, o novo governo dos Estados Unidos reverteu a política de Trump nesse setor e abandonou oficialmente a aliança que criou ao lado do Brasil para impedir que entidades internacionais e programas fizessem qualquer referência a direitos reprodutivos e sexuais. A coalizão ficou conhecida como Consenso de Genebra, reunindo principalmente governos de extrema-direita e ditaduras.

O Secretário de Estado e o secretário de Saúde, de forma apropriada, devem deixar de co-patrocinar a Declaração do Consenso de Genebra e notificar aos demais co-patrocinadores e signatários da retirada dos EUA“, diz o texto de Biden.

Num e-mail de 20 de janeiro de 2021 obtido pela coluna, Valerie Huber se despede dos demais colegas e “anuncia que o Brasil, gentilmente, ofereceu de servir agora como coordenador dessa coalizão histórica”. “Países que desejam se unir à Declaração podem fazer isso contactando a embaixada do Brasil nos EUA, por mais detalhes”, explicou.

Huber foi a pessoa que arquitetou a coalizão e, ao longo dos últimos meses, costurou uma aproximação importante com a pasta de Damares Alves.

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Nas últimas semanas, a embaixada do Brasil em Washington passou a estar no centro das atenções por conta dos relatos que enviou para Brasília, citando meios de comunicação nos EUA próximos ao governo Trump e que insistiam sobre a possibilidade de fraude na eleição americana.

Nessa aliança ultraconservadora, o Brasil de Ernesto Araújo e Damares Alves eram considerados dentro da diplomacia americana como aliados estratégicos. O grupo argumenta que existiria uma manobra nas entidades internacionais para incluir termos como direito à saúde reprodutiva e sexual nos programas, o que abriria uma brecha para legitimar o aborto.

Na aliança, portanto, foi estabelecido que os governos reafirmariam a rejeição ao aborto e a defesa da família. Os países, ao assinarem a proposta, enfatizariam que “em nenhum caso o aborto deve ser promovido como método de planejamento familiar ” e que “quaisquer medidas ou mudanças relacionadas ao aborto dentro do sistema de saúde só podem ser determinadas em nível nacional ou local de acordo com o processo legislativo nacional“.

O temor do grupo é infundado. Em todos os textos aprovados na ONU (Organização das Nações Unidas) ou na OMS, qualquer referência a esses temas sempre vem acompanhado por um alerta de que leis nacionais devem ser respeitadas.

Procurado, o Itamaraty não deu até o momento uma resposta sobre esse papel assumido pela embaixada do país nos EUA. Mas explicou que a posição do governo brasileiro não mudaria no que se refere ao aborto e à existência da coalizão.

A chancelaria deixou claro que o Brasil “seguirá mantendo posição internacional coerente com seu histórico de defesa e promoção dos direitos humanos, em conformidade com a legislação nacional“.

O Brasil defende o papel central da família e o direito à vida, e rechaça o aborto como método de planejamento familiar. Como é de conhecimento, o aborto é considerado crime no Brasil, não sendo passível de punição em três casos: i) gravidez resultante de estupro; ii) risco de morte para a mãe; e iii) anencefalia“, explicou a chancelaria.

O Brasil co-patrocinou, juntamente com EUA, Egito, Hungria, Indonésia e Uganda, a Declaração sobre o Consenso de Genebra, que visa a promover os quatro pilares da coalizão dos países signatários: (a) melhor saúde para as mulheres; (b) promoção do direito à vida; (c) fortalecimento da família como unidade fundamental da sociedade; e (d) proteção da soberania nacional na política internacional“, afirmou.

A Declaração conta com a subscrição de 35 países, de todos os continentes, e continua aberta a adesão de outros. Até o momento, nenhum país signatário comunicou sua intenção de se dissociar do teor da Declaração“, indicou o Itamaraty.

Estratégia para manter a coalizão

Em seu e-mail, a ex-representante de Trump também insiste em pedir que os colegas continuem a “apoiar países que assinaram a declaração e que peçam que mais países se unam“.

No documento, a ex-assessora da Casa Branca ainda da sugestões de como o grupo pode manter viva a agenda ultraconservadora. A estratégia inclui “entrar em contato com ONGs ao redor do mundo que concordaram em compartilhar esses detalhes com esta comunidade global com a mesma opinião“. Também é sugerido que se aumente a pressão para garantir “prestação de contas da ONU e da OMS“.

Sinto-me honrado por ter trabalhado em parceria com outras nações que igualmente valorizam a saúde da mulher, a família, a vida em todos os estágios de desenvolvimento e o direito soberano das nações de fazer suas próprias leis protegendo a vida“, escreveu, em sua despedida. “Esta coalizão histórica deve permanecer forte“, completou.

OMS, ONU e sociedade civil comemoram

Se o Brasil não modifica sua postura, a realidade é que a decisão de Biden foi amplamente comemorada pelas entidades internacionais. Um dos pontos centrais é que, ao mudar de postura, a Casa Branca volta a financiar entidades internacionais que tenham, em sua pauta, temas como acesso à educação sexual, direitos reprodutivos e direitos sexuais.

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Trump havia desenterrado a “Política da Cidade do México“, que se refere a um pacote de medidas criadas ainda nos anos 80. Elas exigiam que todas as ONGs e entidades recebendo recursos dos EUA se comprometam a não prestar qualquer serviço de aborto, aconselhamento sobre a opção de aborto, se referir ao aborto e nem fazer campanhas pelas liberação legal da prática.

Ao ser adotada por Trump, a medida havia secado o financiamento de US$ 15 bilhões para entidades que atendiam a meninas e mulheres em países mais pobres do mundo.

O fim da postura americana foi aplaudida pela OMS, que insistiu sobre o papel central que o atendimento a meninas e mulheres representa para a saúde global.

O secretário-geral da ONU, António Guterres, também comemorou. “Saúdo o anúncio da Administração Biden-Harris de restaurar o financiamento ao Fundo de População da ONU (UNFPA)“, disse, numa referência a uma das instituições das Nações Unidas que tinha sido afetada pelo corte de dinheiro.

A decisão transformará e salvará vidas de mulheres e meninas em todo o mundo, desde as emergências humanitárias mais urgentes até as comunidades mais remotas e difíceis de alcançar, e em todos os lugares entre elas“, afirmou.

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Saúdo ainda o anúncio do Presidente Biden de rescindir a Política da Cidade do México. Esta Política tem levado ao corte de recursos não apenas dos serviços de saúde reprodutiva em todo o mundo, mas também, nos últimos anos, a serviços de saúde mais amplos, uma questão que, em meio à atual pandemia, tem se mostrado central para alcançar as Metas de Desenvolvimento Sustentável. Juntas, estas decisões também enviam uma poderosa mensagem às mulheres e meninas em todo o mundo de que seus direitos são importantes“, completou Guterres.

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