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Ditadura Militar 28/Mai/2018 às 12:37 COMENTÁRIOS
Ditadura Militar

A capa histórica criada por Alberto Dines para driblar a ditadura militar

Publicado em 28 Mai, 2018 às 12h37

Alberto Dines driblou ditadura militar e criou capa histórica no Jornal do Brasil. Jornalista, que morreu na última terça-feira, fez uma capa de jornal sem manchete para noticiar o golpe militar contra Salvador Allende, no Chile

capa histórica criada por Alberto Dines para driblar a ditadura militar

Opera Mundi

O jornalista Alberto Dines, morto nesta terça-feira (22/05) aos 86 anos, foi o responsável por uma das capas mais emblemáticas da história do jornalismo brasileiro. Em setembro de 1973, um golpe militar derrubou o então governo (democraticamente eleito) de Salvador Allende, no Chile, e instaurou uma ditadura que durou quase 17 anos.

A censura do regime militar proibiu que se desse manchete para o golpe no Chile. Dines, então, decidiu fazer uma primeira página só com texto – e driblou a ordem do governo.

Em uma entrevista ao Jornal da ABI em 2012 (reproduzida no Observatório da Imprensa, projeto tocado pelo jornalista), Dines conta como foi tomada a decisão:

Uma das causas da minha saída do JB, em 1973, foi porque eu forcei isso. Quando houve o golpe militar no Chile, veio a ordem da censura para não dar manchete sobre a derrubada do Salvador Allende. Mas a ordem chegou tarde da noite e o Allende estava na manchete! A essa altura, eu já não fechava o jornal. Nós decidíamos a primeira página e eu ia para casa. Já me dava esse direito. O Lemos também já tinha saído e quem ligou foi o Maneco Bezerra [da Silva], excelente jornalista que trabalhava na oficina. Ele alertou da ordem e fui imediatamente para lá. Morava em Ipanema, pegava o Aterro [do Flamengo] e era fácil chegar ao prédio novo do JB naquela hora, quase 11 horas. Quando cheguei um dos superintendentes do jornal já estava lá, mas ele não se meteu. E aí eu falei: ‘Vamos obedecer. Não vamos dar na manchete. Vamos fazer um jornal sem manchete! Vamos contar a história com o maior corpo possível da Ludlow…’ Esse era corpo 24, se não me engano… Contamos a história toda e ficou, digamos, um pôster sem manchete. O superintendente do jornal me perguntou: ‘Dines, você tem certeza mesmo que quer fazer isso?’. E eu respondi que nós estávamos obedecendo às autoridades. No dia seguinte o Armando Nogueira, que estava na TV Globo, me telefonou logo cedo: ‘Porra! Isto é uma revolução!’. A direção não criticou nem elogiou. Quem elogiou foram os bons jornalistas. A capa está reproduzida em um livro que organizei, ‘Cem Páginas Que Fizeram História’, com a reprodução de outras páginas importantes de vários jornais. Mas a verdade é que três meses depois eu fui demitido por ‘indisciplina’.

Quem foi Alberto Dines

Jornalista, professor universitário, biógrafo e escritor, Dines teve destaque em vários veículos de comunicação. Começou a carreira no jornalismo em 1952, na revista A Cena Muda e no ano seguinte participou da fundação da revista Visão para acompanhar reportagens da área artística. Em 1957, trabalhou na revista Manchete, de propriedade de Adolpho Bloch. Dines também era um dos maiores especialistas da obra do romancista austríaco Stefan Zweig no país.

Dois anos depois, se tornou diretor do segundo caderno do jornal Última Hora, de Samuel Wainer. No ano seguinte, dirigiu o jornal Diário da Noite, dos Diários Associados, pertencente a Assis Chateaubriand. Em 1962 virou editor-chefe do Jornal do Brasil, onde permaneceu até 1973, depois do episódio do golpe no Chile.

Dines estava internado há dez dias no Hospital Albert Einstein, em São Paulo. O hospital informou que o jornalista morreu às 7h15, vítima de deficiência respiratória.

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