Redação Pragmatismo
Notícias 22/Jun/2021 às 16:58 COMENTÁRIOS
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Polícia executa jovem com deficiência intelectual que apoiou Lázaro nas redes

Publicado em 22 Jun, 2021 às 16h58

"Foi uma crueldade, ele nunca fez mal a ninguém, mataram ele na frente de um idoso de 99 anos. Jogaram na viatura como se fosse animal". Policiais invadiram casa e executaram jovem de 23 anos com deficiência intelectual que havia feito post sobre Lázaro nas redes

hamilton jovem deficiência intelectual
Hamilton ao lado do avô, a quem chamava de ‘pai’

Beatriz Drague Ramos, Ponte

Crueldade foi a palavra utilizada por Ana Maria Lima Dias, 41 anos, para definir a morte de seu filho Hamilton Cesar Lima Bandeira, de 23 anos. O jovem foi morto, no início da tarde de quinta-feira (17/06), com três tiros disparados por policiais civis no povoado de Calumbi, perto de Presidente Dutra, no interior do Maranhão, distante cerca de 350 km da capital São Luís. “Foi uma crueldade, ele nunca fez mal a ninguém, mataram ele na frente de um idoso de 99 anos”, disse Ana Maria. As informações são da Ponte Jornalismo.

Hamilton tinha deficiência intelectual e tomava remédios controlados. Ele passou a ser alvo da polícia de Presidente Dutra depois de postar uma imagem na rede social Instagram na qual estava escrito: “Eu sou teu ídolo, Lázaro. Boa sorte, Lázaro (sic)”. Lázaro Barbosa, 32 anos, é procurado pela polícia em Goiás há 12 dias sob suspeita ter matador ao menos cinco pessoas _um caseiro, em 5 de junho; um casal e os dois filhos, no dia 12. Os crimes foram em Cocalzinho de Goiás.

“Ele tinha 23 anos, mas tinha mentalidade de um rapaz de 12 anos porque tinha um distúrbio mental. Ele nunca matou, nunca roubou, nunca estuprou, apenas postava essas coisas porque ele tinha problemas mentais, tenho laudos que provam isso”, disse Ana Maria, atendente em uma loja de conveniência em um posto de combustíveis.

De acordo com a mãe, três dias antes de ser morto pela Polícia Civil, Hamilton tentava conseguir os medicamentos controlados que tomava. “Ele ligou para a mulher trazer os remédios dele, inclusive uma assistente social vinha conversar com ele, com a gente, para nos orientar, mas felizmente não deu tempo”.

Ana Maria conta que, na manhã da morte do filho, ela estava trabalhando e Hamilton, que vivia com o avô, estava arrumando a casa e fazendo o almoço para o idoso. “Eu não estava no local, fiquei sabendo por uma ligação da minha vizinha. Por volta das 10h, ele [Hamilton] ficou jogando bola com crianças na casa de um vizinho. Às 11h, ele foi para casa tomar banho, limpou a casa, lavou a louça, almoçou e deu almoço para o avô, para quem disse iria descansar”.

Instantes depois, o avô de Hamilton foi surpreendido com a chegada de três policiais, contou Ana Maria. “Meu filho entrou no quarto e deitou na cama. Quando o avô dele sentou para comer, os policiais chegaram e perguntaram se tinha mais alguém na casa. Foi quando o avô levantou da cadeira e falou: ‘estou só eu e o meu neto’. Nesse momento, Hamilton se levantou da cama, abriu a cortina [o quarto não tem porta] e, sem poder dizer nada, tomou três tiros seguidos, sem ele poder nem se defender”.

No segundo tiro, Hamilton caiu e falou para o avô [a quem chamava de pai]: “Pai, está doendo demais!”. “Os policiais pegaram ele pelas pernas e pelos braços e o jogaram na viatura como se fosse um animal. Ele até machucou o rosto porque bateu nos ferros da viatura. Levaram imediatamente para o Socorrão [Hospital Regional de Urgência e Emergência de Presidente Dutra], mas ele já chegou lá sem vida”, contou Ana Maria.

Assim que soube da morte do filho, Ana foi ao hospital e, depois foi à delegacia da Polícia Civil do Maranhão em Presidente Dutra, onde tentou registrar um boletim de ocorrência com a versão dos familiares sobre o que se passou dentro de sua casa, mas o delegado César Ferro, segundo a mãe, se negou a registrar o documento.

O delegado disse apenas que Hamilton havia sido “pego em flagrante”. “O delegado se recusou a fazer o BO. Disse que o Hamilton foi para cima dos policiais com uma faca. Só que como é que uma pessoa vai para cima de três policiais com uma faca? Quando eu perguntei se ele sabia que o meu filho tomava remédios para os problemas mentais, o delegado ficou quieto”.

Segundo Ana Maria, o delegado não mostrou a suposta arma branca à família e nem disponibilizou nenhum mandado de prisão ou de busca e apreensão que justificasse a ida dos policiais civis até a casa da família. Além disso, o corpo de Hamilton logo foi retirado da casa e nenhuma perícia foi feita, de acordo com a mãe do rapaz. “Não mandaram ninguém fazer a perícia, mandaram outros policiais retirarem as cápsulas das armas. Eles não me deram a declaração de óbito”.

A morte de Hamilton, enterrado na sexta-feira (18/06), revoltou os moradores da região de Presidente Dutra. No sábado (19/06), vizinhos do jovem queimaram pneus na cidade. A família organiza uma nova manifestação para a próxima quarta-feira (23/06), na mesma cidade.

Segundo Ana, Hamilton era muito querido entre os vizinhos e, apesar do déficit intelectual, trabalhava e estudava. “Ele era muito prestativo, muito trabalhador, era ajudante de pedreiro, pintava, capinava, todo mundo aqui viu ele crescer, ele respeitava as crianças, os mais velhos e estava acabando o ensino médio. Quando estava agitado, ele passava o dia na casa dos vizinhos. Ele era conhecido, fazia muita ‘macacada’, todo mundo gostava dele”.

A última vez que Ana viu o filho foi na terça-feira (15/06). “Estávamos almoçando na casa da minha mãe, ele estava brincando falando para o meu pai que tinha visto moças bonitas”, conta a mãe que agora quer justiça pela morte de seu filho. “Eu quero justiça, quero lutar pela memória do meu filho, sei que não vai trazer ele de volta. Eu sei que a batalha vai ser difícil, mas não vou desistir. Enquanto estiver viva, vou lutar pela memória do meu filho”.

Outro lado

Segundo a polícia, ao invadirem a residência os agentes foram ameaçados pelo rapaz, que estaria em posse de uma faca. Ao tentar conter Hamilton Cesar, os agentes atiraram contra o rapaz. O comando da Polícia Civil no Maranhão anunciou que afastou os três agentes que participaram do assassinato do jovem.

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