Anderson Pires
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Jair Bolsonaro 28/Jul/2022 às 17:05 COMENTÁRIOS
Jair Bolsonaro

Sem facada e kit gay, Bolsonaro saiu do armário

Anderson Pires Anderson Pires
Publicado em 28 Jul, 2022 às 17h05

Bolsonaro não tem mais como se esconder na hora que for questionado sobre os temas que a população mais busca respostas. Muito menos poderá fazer uso de decretos centenários de sigilo para encobrir desmandos e abusos que comete

Sem facada kit gay Bolsonaro saiu armário
Imagem: reprodução | twitter de Flávio Bolsonaro

Anderson Pires*

A eleição para presidente do Brasil em 2018 foi um episódio inédito na história. O país vinha de um período de grande instabilidade desde 2013, passou por uma eleição tumultuada em 2014, foi palco de operações policiais espetaculares, com destaque para a Lavo Jato que tentou definir os destinos político e econômico dos brasileiros, com base em convicções, moralismo e a serviço de interesses empresariais externos.

Até chegar as eleições em 2018, o Brasil teve todo seu setor produtivo desmontado, com os principais grupos empresariais envolvidos nos processos da Lava Jato. O que parecia uma ação de apuração e punição à corrupção, serviu para destruir empregos, barrar investimentos, favorecer especuladores e entregar setores estratégicos à corporações internacionais.

Os aplausos que muitos deram a turma de Dalagnol e Moro era uma demonstração de sandice, quem aplaudia era parte dos prejudicados. Existe corrupção no Brasil e nas relações entre governo e empresários, isso é fato. Não é um fenômeno brasileiro, a corrupção é parte do custo que o capitalismo transfere para sociedade. Em muitos países parte dela é institucionalizada, como nos Estados Unidos, que adota o lobby como prática legal.

Mas na hora que empresas passam a fazer parte da sociedade, como era o caso de todos os grandes grupos brasileiros com capital aberto, não se pode confundir os gestores corruptos com as empresas. Temos que lembrar que o fundo de pensão do trabalhador investiu em papéis dessas companhias. Quando se destrói uma Odebrecht, milhões de pessoas irão perder mesmo sem ter nada a ver com a corrupção praticada. O estrago decorrente do ativismo judicial desconsidera o contexto social.

Imagine se o grupo Volkswagen tivesse sido destruído em decorrência do escândalo internacional por fraude na emissão de poluentes nos carros das suas marcas, descoberto em 2015. Os gestores foram presos e a empresa penalizada. Foram cobradas indenizações e compensações ambientais muitas vezes maiores que as sofridas pela Odebrecht. Em momento algum foi noticiado que o grupo seria o mais corrupto do mundo? A punição dos seus dirigentes não comprometeu o andamento das atividades, muito menos o juiz e os promotores foram alçados a qualidade de popstars. Houve perda especulativa, mas não uma destruição que certamente iria prejudicar milhões de pessoas na Alemanha e no mundo.

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Mas nada disso foi debatido nas eleições em 2018. Após a Lava Jato destruir as bases econômicas do país, trabalharam para concluir o serviço de desmonte com o apoio a Bolsonaro. Reforçaram a pauta de que o pleito seria um plebiscito entre corruptos e não corruptos. Além disso, o debate identitário teve destaque e deixou religiosos conservadores à vontade para defenderem Bolsonaro com muito afinco. Afinal, probidade não é o forte dos neopentecostais.

Entre bravatas sobre a honestidade do bolsonarismo e bandeiras conservadoras, conduziram a campanha para presidente sem sequer a possibilidade de uma arguição mais contundente, já que o candidato passou todo período hospitalizado, após levar uma facada durante evento em Juiz de Fora.

O direito de ficar calado serviu para que a defesa de Bolsonaro fosse feita por uma massa de seguidores do lavajatismo, pastores conservadores, empresários alheios a sociedade (muitos sonegadores) e agentes do Estado, que se apropriaram da coisa pública por meio de concursos, passaram a ter um candidato oficial: o legítimo representante de uma elite privilegiada.

Esse grupo achou mais importante debater a implantação do kit gay e a prisão de Lula, do que os reais problemas que o Brasil teria para enfrentar após toda desordem que foi construída desde 2013, passando pela Lava Jato e o golpe que tirou Dilma da presidência e empossou Michel Temer.

Passaram um cheque em branco para Bolsonaro e estabeleceram que o importante era derrotar o PT, independentemente do que poderia vir. A candidatura de Haddad e a imprensa também embarcaram na pauta bolsonarista. O debate sobre kit gay, ideologia de gênero, machismo e racismo foram priorizados. Temas importantes, mas que o embate era sempre de ordem moral, em contraposição a fake News, o que deixava os seguidores do “Mito” à vontade para o defenderem com muita ênfase.

Para as próximas eleições Bolsonaro será obrigado a sair do armário e se expor a temas que antes passava tangente, mas que agora são de sua inteira responsabilidade. Não terá mais uma facada como desculpa para ficar fora dos debates e entrevistas. Os temas de ordem moral que sempre priorizou estão mais que cansados. Nem fazer arminha irá lhe render alguma adesão. Corrupção é outro tema que terá que fazer de conta que nunca ouviu falar.

No seu palanque estarão Waldemar da Costa Neto, Roberto Jeferson, Eduardo Cunha, Fernando Collor de Mello e mais uma série de figuras ilustres, que acumulam quilômetros de denúncias e processos. Bolsonaro que é um verdadeiro gênio das finanças pessoais junto com seus filhos, terá que explicar os motivos da economia brasileira em frangalhos, com inflação e câmbio descontrolados, endividamento recorde das famílias, renda média cada dia menor e milhões de pessoas passando fome.

Será tarefa difícil explicar, mesmo com uma pandemia, que o Brasil voltou para o mapa da fome, mas os lucros dos bancos e estatais nunca foram tão altos. Dizer que pegou o país quebrado não surtirá efeito, diante de todos os rombos gerados nas contas públicas durante o Governo Bolsonaro. Apenas a PEC dos Precatórios, a PEC Kamikaze, a antecipação de lucros e dividendos das estatais e o orçamento secreto somam mais de 180 bilhões de reais destinados para cobrir medidas de cunho eleitoreiro sem qualquer responsabilidade com as contas públicas.

Se colocarmos a privatização da Eletrobras nessa conta somamos mais 100 bilhões em benesses e vantagens que serão destinadas para amenizar o desgaste de Bolsonaro em decorrência dos constantes aumentos nas contas de energia, além de favorecer amigos empresários do setor.

A irresponsabilidade de Bolsonaro é absoluta para tentar minimizar a avaliação negativa do seu governo. A rejeição verificada nas pesquisas mostra que será quase impossível sucesso na reeleição. Mas até para a possibilidade de golpe é necessário diminuir a insatisfação da população, como forma de equilibrar a opinião pública.

Bolsonaro não tem mais como se esconder na hora que for questionado sobre os temas que a população mais busca respostas. Muito menos poderá fazer uso de decretos centenários de sigilo para encobrir desmandos e abusos que comete.

A farsa que montou apoiada por favorecidos, preconceituosos e ignóbeis não será mais suficiente para dar respostas aos problemas do Brasil. O miliciano que faz arminha, propaga violência, mas vive de falar em Deus precisará de um milagre para ganhar as eleições. Fora isso, só resta aceitar a derrota ou preparar um golpe.

*Anderson Pires é formado em comunicação social – jornalismo pela UFPB, publicitário, cozinheiro e autor do Termômetro da Política.

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