Na era Bolsonaro, jornalistas podem ser humilhados, presos e assassinados
Nesta semana vimos uma repórter ser submetida à humilhação mais rasteira pelo bolsonarismo. Um jornalista brutalmente assassinado ao lado da esposa e filhos enquanto jantava em casa. E, para fechar, a prisão de dois repórteres que investigam a morte do miliciano ligado à família do presidente
Erick Mota, Congresso em Foco
Nesta semana fomos obrigados a ver a reputação pessoal de uma repórter da Folha de S. Paulo ser jogada na latrina de um dos ataques mais vis que o bolsonarismo foi capaz de criar. Um jornalista foi brutalmente assassinado ao lado de sua esposa e filhos enquanto jantava em casa. E para fechar a semana com chave de enxofre, dois repórteres da revista Veja, que investigam a morte do miliciano ligado a família do presidente Jair Bolsonaro, foram detidos pela polícia. Nesta semana a nossa democracia padeceu mais um pouco.
O presidente da República é a autoridade máxima da nação. As falas dele geram impacto direto na economia e no dia a dia das pessoas. Se o presidente, por exemplo, fala que os índios atrapalham o desenvolvimento do país e que as terras indígenas, que são ricas naturalmente, precisam ser exploradas, aumenta o número de invasões a terras indígenas, como em 2019, que teve um aumento de 45% se comparado a 2018 segundo dados do Cimi.
Se o presidente da República diz que ambientalista é criminoso e coloca fogo na floresta, as autoridades criam uma certeza de que precisam combater esse “bando de bandido” e logo três brigadistas são presos em Alter do Chão, sem provas, sem nada.
Se o presidente tem falas homofóbicas, há um aumento no número de mortes por homofobia, como aconteceu em 2019, que aumentou 14% este tipo de crime, segundo o relatório do Grupo Gay da Bahia.
As falas do presidente tem o poder de animar e desanimar o mercado financeiro, de enfurecer e de acalmar a população, de resguardar ou de colocar em risco a vida de pessoas. E os jornalistas são um dos alvos favoritos do atual ocupante do Palácio da Planalto.
Jornalistas e veículos de imprensa foram atacadas 208 vezes em 2019, isso representa um aumento de 54,07% se comparado a 2018. Os dados são da Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj). Somente o presidente Jair Bolsonaro foi responsável por 121 dos ataques.
Esta normalização da violência contra a imprensa faz com que um depoente minta descaradamente na CPI das Fake News. Hans River falou que uma jornalista da Folha de S. Paulo se insinuou sexualmente para ele para obter informações. O que foi desmentido minutos depois pelo jornal que publicou áudios e mensagens de textos trocados entre a jornalista e o agora denunciado por falso testemunho.
Mas nem o desmentido foi capaz de diminuir os ataques sofridos pela repórter, que foi alvo de ataques sujos, baixos, sexistas e covardes de homens e mulheres bolsonaritas nas redes. Rapidamente os ataques a repórter se alastraram e viraram ataques à imprensa no todo. “Piadas” com “furo de reportagem”, “pauta” e “exclusiva” tomaram conta dos perfis mais infames da internet. Se tivesse parado por aí, já seria ruim demais, mas tudo isso foi além. O filho do presidente da República, Eduardo Bolsonaro, que ocupa o cargo de deputado federal e líder do PSL, subiu na tribuna da Câmara e atacou a repórter, reforçando a versão comprovadamente mentirosa do denunciado.
Nesta mesma semana, o jornalista Leonardo Veras foi brutalmente executado a tiros. Ele estava jantando em casa ao lado da mulher e dos filhos, quando dois homens invadiram sua casa e fizeram dezenas de disparos contra ele. Leonardo era conhecido pela cobertura que realizava dos crimes cometidos na fronteira entre Brasil e Paraguai.
O que aconteceu após o assassinato? Silêncio dos bolsonaros. O presidente lamentou a morte do feminicida MC Reaça, que espancou e matou a amante gestante e se matou na sequência, mas se calou diante da morte de um jornalista que investigava o crime organizado. Prioridades do Planalto.
E pra fechar a semana, dois repórteres da Veja foram detidos pela Polícia Militar do Estado da Bahia enquanto investigam a morte do miliciano Adriano da Nóbrega, que tem ligações com Flávio Bolsonaro. O ex-PM foi assassinado durante uma operação policial e a revista está investigando as verdadeiras causas da morte, pois há fortes indícios de ter sido queima de arquivo.
Os jornalistas, mesmo depois de identificados, foram levados para a delegacia, tiveram o gravador apreendido por alguns minutos e liberados tempos depois.
O discurso dos bolsonaros contra a imprensa encoraja estes ataques, até mesmo em um estado comandado por um governador do PT, e leva a população a ficar anestesiada quando a imprensa sofre este tipo de golpe. O que muitos não percebem, no entanto, é que uma imprensa livre é um dos pilares da democracia.
Se Jair, Eduardo, Flávio e Carlos Bolsonaro tivessem o mínimo apreço à democracia, ao povo e a liberdade, teriam saído em defesa da imprensa pelo menos nestes três assuntos. Mas a imprensa incomoda e eles não gostam disso.
A imprensa revela que Jair Bolsonaro tem em seu governo pessoas investigadas por corrupção. Que Flávio e Carlos são investigados por rachadinha em seus gabinetes e que os bolsonaros mantém um vínculo bem estreito com milicianos, incluindo o que foi morto em ação policial nesta semana.
Sem uma imprensa livre, quem vai denunciar os desmandos do governo? A quem interessa uma imprensa com medo? A quem interessa que o povo não dê crédito para a imprensa?