Redação Pragmatismo
Racismo não 17/Out/2019 às 17:12 COMENTÁRIOS
Racismo não

Caso de assalto a posto com 3 mortes tem reviravolta após divulgação de vídeo

Publicado em 17 Out, 2019 às 17h12

Vídeo mostra ação destrambelhada de guardas e provoca reviravolta em caso de roubo com 3 mortes em posto de gasolina. Ao contrário da versão informada pelos guardas, pessoas que morreram na ação não eram os assaltantes, mas civis inocentes. Jovem que passou 4 dias preso ganha liberdade e chora

assalto posto de gasolina
(Imagens do assalto desmontam versão apresentada por guardas)

O caso de um assalto em um posto de gasolina da cidade de Itaquaquecetuba (SP) teve total reviravolta após a divulgação das imagens de câmeras de monitoramento.

Kauê Oliveira Francisco, de 21 anos, passou quatro dias preso acusado de ser um dos assaltantes, mas foi solto na noite desta quarta-feira (16). A polícia requisitou a soltura depois de analisar todas as imagens.

Kauê, que é negro, estava voltando de Aparecida (SP) junto com dois amigos, também negros, depois de vender sorvete e água para devotos no feriado de Nossa Senhora Aparecida. Os jovens pararam para abastecer e guardas municipais os confundiram com assaltantes.

“Nós vimos o assalto e ficamos dentro do carro. Eu falei para meus amigos ficarem dentro do carro, vamos ficar dentro do carro, vamos esperar os ladrões irem embora. Aí o guarda chega e começa a tirar em ‘nós tudo’. E eu saio para pedir ajuda e já me dão um rodo e começam a me bater”, contou Kauê, aos prantos.

“Na hora do posto lá, ele [guarda] começou a me bater, eu falando que era sorveteiro. Eu falei pode ir ver o sorvete e as águas no carro. Eles começaram a bater, dar coronhada. Eles falaram que eu estava junto, que eu que matei a mulher dele lá”, continua Kauê.

Os dois amigos de Kauê e a namorada de um dos guardas morreram durante a ação. Os verdadeiros assaltantes fugiram, ilesos.

Entenda o caso

Os guardas municipais de Itapecerica da Serra, vítimas do assalto, haviam relatado que os assaltantes tinham descido do carro prata e anunciaram o roubo. Segundo a versão dos guardas, eles dispararam contra o veículo e mataram dois criminosos. No entanto, os homens que os guardas mataram eram os amigos de Kauê, dois civis inocentes.

Os vídeos, portanto, foram decisivos para esclarecer o caso. As imagens mostram os dois ladrões chegando a pé ao posto de gasolina e anunciando o assalto. Logo na sequência chega o carro prata onde estão Kauê Oliveira Francisco, Rodnei Alves dos Reis e Bruno Nascimento de Souza. Eles não saem do veículo.

Os verdadeiros ladrões apontam as armas e rendem as vítimas. Um dos criminosos sobe na motocicleta que está atrás da bomba de combustível. Mas quando eles estão saindo, começa uma troca de tiros. A namorada de um dos guardas, de blusa clara no chão, é baleada e morre no local.

O guarda que está em pé descarrega sua arma no carro onde estão Kauê e os amigos. Rodnei Alves dos Reis e Bruno Nascimento de Souza foram executados no local. Eles não provocaram reações e sequer saíram do veículo.

As imagens mostram ainda quando Kauê Francisco sai do carro. Ele está ferido com um tiro na mão. O guarda se aproxima, rende o jovem e o agride com vários chutes na cabeça e coronhadas. Depois, ele ainda pede ajuda e imobiliza Kauê.

“Eu quero Justiça para os meus amigos. Eles eram inocentes e nada vai trazer a vida deles de volta”, disse Kauê ao sair da prisão. Na tarde desta quarta-feira (16), familiares e amigos de Kauê e das duas vítimas fizeram um protesto pedindo Justiça. “Eles eram pais de família, queridos por todos. Não tem que confundir. Por que confundiram?”, questionou um familiar, emocionado.

A mãe de Bruno disse que ele era ambulante e tinha três filhos. Ela contou que o filho insistiu para ir para Aparecida vender sorvete. “Saiu de manhã, falando: ‘tchau mãe, tô indo vender na Aparecida’. Ele vendia muito nos eventos”.

Racismo institucionalizado

Nas redes sociais, internautas questionaram se os jovens teriam sido “confundidos” com assaltantes caso fossem brancos de olhos claros. “É triste, mas os rapazes morreram e o outro foi espancado e preso porque são negros. Como diz o ditado, ‘a carne mais barata do mercado é a carne negra’. Torço, em vão, para que haja Justiça. Como se neste país houvesse justiça para preto e pobre”, pontuou uma internauta.

Segundo os últimos dados coletados pelo Atlas da Violência, dos 65,6 mil homicídios ocorridos no Brasil no último ano, 75,5% deles foram cometidos contra negros — a maioria jovens. Rodnei Alves dos Reis e Bruno Nascimento de Souza acabam de ingressar nessa estatística.

Kauê chora ao falar do caso
Kauê e os amigos foram vender sorvete no feriado de Nossa Senhora Aparecida

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