Redação Pragmatismo
Juristas 01/Mar/2019 às 16:53 COMENTÁRIOS
Juristas

Sergio Moro é despreparado para suceder Celso de Mello

Publicado em 01 Mar, 2019 às 16h53

Em apenas dois meses de governo, Sergio Moro já conseguiu marcar sua nítida diferença de conduta com aquele que supostamente deseja substituir. Afinal, dignidade e reputação se conquistam ao longo de toda uma vida. Celso de Mello, conservador ou não, conquistou-as. Fale-se dele o que se quiser, menos que lhe falta coerência

Sergio Moro despreparado suceder Celso de Mello STF Ministro
Sérgio Fernando Moro e Ministro Dias Toffoli (Imagem: Marcello Casal Jr | ABr)

Marcelo Auler, em seu blog

A História revelará um dia o “acerto” que o então juiz Sérgio Moro, que se apresentava como exemplo de coerência, terá feito com o então candidato Jair Bolsonaro, ao abandonar a magistratura para assumir o ministério da Justiça.

Somente o tempo confirmará a versão de que o magistrado de primeira instância, ao se incorporar a um presidente nitidamente despreparado, intolerante e faccioso, pretendeu pular etapas para chegar rapidamente a um cargo vitalício na mais alta corte do país, o Supremo Tribunal Federal (STF).

A se confirmar tal “acerto”, a Moro está reservada a cadeira do ministro Celso de Mello. Será o primeiro a se aposentar compulsoriamente, aos 75 anos, em novembro de 2020, após 31 anos na corte (ingressou em agosto de 1989). Três décadas em que, independentemente de posições assumidas, construiu carreira digna e coerente, que lhe garante hoje a reputação que desfruta.

Em apenas dois meses de governo, Moro já conseguiu marcar sua nítida diferença de conduta com aquele que supostamente deseja substituir. Afinal, dignidade e reputação se conquistam ao longo de toda uma vida. Celso de Mello, conservador ou não, conquistou-as. Fale-se dele o que se quiser, menos que lhe falta coerência, algo fundamental para atingir a dignidade, a reputação e o respeito.

Coerência que Moro começou a atropelar ao aceitar um convite de um ainda candidato que ele indubitavelmente ajudava a vencer ao prender seu principal concorrente, através de uma sentença totalmente questionável.

Como ministro da Justiça, em apenas 60 dias, acumulou fatos que demonstram sua despreocupação com a reputação que conquistara entre os seus, atropelando a coerência que se exige daqueles que se apresentam como vestais da moralidade.

Ocorreu com a liberação das quatro armas por residência, que ele antes defendia serem no máximo duas.

Repetiu-se no dito “perdão” ao colega de ministério, Ônyx Lorenzoni, por duas vezes flagrado recorrendo ao Caixa-2.

Voltou a acontecer no seu silêncio diante das provas de movimentações financeiras atípicas em torno do primogênito do presidente, o hoje senador Flávio Bolsonaro.

Silenciou-se ainda ao surgir o “laranjal” que abasteceu as campanhas dos partidários de Bolsonaro, incluindo novamente um colega de ministério, Marcelo Álvaro Antônio, do Turismo.

Como se não bastasse, desmentiu a si mesmo ao se deixar pressionar e retirar do seu projeto de lei a criminalização do “Caixa 2 nas campanhas, bandeira que sempre empunhou ao lidar com os adversários dos seus hoje aliados.

Surge agora o “desconvite” feito na quinta-feira (28/02), à cientista política Ilona Szabó, 24 horas depois de tê-la chamado para compor o Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária. Ao anunciar a decisão – imposição que os jornais dizem ter lhe sido feita por Bolsonaro -, Moro, como se buscasse uma espécie de remissão, reafirmou publicamente os “relevantes conhecimentos da nomeada na área de segurança pública” que justificaram o convite feito. Sequer escondeu ter cedido à “repercussão negativa em alguns segmentos”. Entenda-se, os bolsonaristas da extrema direita e das redes sociais.

Com esta demissão (ou “desconvite”) o suposto guardião moral da República de Curitiba novamente deixou de lado qualquer preocupação com a coerência. Sinalizou claramente que os interesses políticos do grupo ao que se aliou superam a dita preocupação com o futuro do país. Ao mesmo tempo demonstrou que na pasta que comanda, a competência não é o fator primordial. Aderiu ao chamado pensamento único, que não admite, sequer em um conselho, portanto, um colegiado, pessoas com ideias e propostas divergentes.

Definitivamente chancelou a diferença da sua conduta com a do decano do Supremo que, segundo consta, almejaria substituir. Sua atitude nesta quinta-feira rendendo-se às pressões sofridas pela matilha, selou de vez a distância que o separa de uma carreira onde sobressaia a dignidade.

Em posição diametralmente oposta, Mello, na quarta-feira, 20 de fevereiro, ao proferir o já histórico voto a favor da criminalização da homofobia (Homofobia, STF, Bolsonaro, Congresso. E o Lula?), demonstrou seu desprezo ao aplauso fácil em nome da coerência em posicionar-se a favor das minorias. Acentuou, inclusive, ter consciência de que remava contra a maré. Por isso admitiu que seria “inevitavelmente incluído no índex, mantido pelos cultores da intolerância.”

Apesar dessa “convicção”, não abriu mão de seus princípios e posicionamentos, como tem feito o ministro da Justiça. Ao contrário, fez questão de criticar/denunciar aqueles de “mentes sombrias, que rejeitam o pensamento crítico, que repudiam o direito ao dissenso, que ignoram o sentido democrático da alteridade e do pluralismo de ideias, que se apresentam como corifeus e epígonos de sectárias doutrinas fundamentalistas, desconhecem a importância do convívio harmonioso e respeitoso entre visões de mundo antagônicas“.

Exatamente os mesmos que compõem a “matilha” à qual Moro cedeu, nesta quinta-feira. Atitude com a qual demonstrou a sua falta de coragem em manter-se coerente a seus posicionamentos e pensamentos. Exatamente uma das exigências para se conquistar a reputação como a que o decano do STF desfruta.

Gesto suficiente para, em uma sociedade ética, afastá-lo de vez do cargo que almeja. Afinal, demonstrou lhe faltar estofo para substituir o atual ocupante daquela cadeira no plenário do Supremo.

Siga-nos no InstagramTwitter | Facebook

Recomendações

COMENTÁRIOS