Redação Pragmatismo
Mundo 12/Jul/2018 às 13:17 COMENTÁRIOS
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O que precisamos aprender com os meninos da Tailândia

Publicado em 12 Jul, 2018 às 13h17

Senso de gratidão, meditação, homenagens e comemoração na hora certa. Meninos da Tailândia deixam fortes lições sobre respeito e resiliência

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Não temos certeza se isso é um milagre, ciência ou qualquer outra coisa.”

Com essa declaração, a marinha da Tailândia confirmou que todos os 12 garotos do time de futebol e o seu técnico haviam sido resgatados da caverna em Chiang Rai na manhã desta terça-feira (10), após passarem 18 dias isolados, sem acesso à água potável, comida ou mesmo luz solar.

Os garotos, que têm entre 11 e 16 anos, e o técnico, de 25 anos, procuraram abrigo na caverna de Tham Luang, no norte do país, no dia 23 de junho, após serem surpreendidos por uma forte chuva durante um passeio de bicicleta. O nível de água subiu muito rápido e os jovens acabaram ficando presos na caverna inundada. Eles sobreviveram a 9 dias sem qualquer alimento até serem encontrados por dois mergulhadores ingleses na última semana.

A complexa operação de resgate contou com a participação de 90 mergulhadores – 50 estrangeiros e 40 tailandeses – e a história do time Wild Boars mobilizou o mundo inteiro.

O senso de gratidão e a meditação na caverna

Os mergulhadores envolvidos no resgate localizaram a equipe abrigada em uma borda de terra cercada por água a 4 quilômetros de distância após a entrada principal da caverna.

O momento foi registrado em um vídeo que viralizou. Apesar das condições debilitantes em que se encontravam, os jovens chamaram atenção pela tranquilidade e resiliência demonstrada.

“Veja como eles estavam quietos esperando lá. Ninguém chorava nem nada. Foi surpreendente”, contou a mãe de um dos garotos em entrevista à AP, referindo-se ao vídeo.

Na cena compartilhada no Facebook da marinha tailandesa, os garotos repetiam o mesmo gesto: as mãos coladas e trazidas próximas ao coração e à testa em sinal de agradecimento.

O gesto faz parte da cultura da Tailândia e é praticamente uma reação automática de qualquer tai, seja como sinônimo de “obrigado” ou de “desculpa”.

O ato de juntar as mãos é também um dos símbolos do Budismo, a principal religião do país. As cidades tailandesas possuem diversos templos budistas que educam sobre a filosofia e também oferecem espaços para meditação.

Foi em um desses templos no mosteiro em Mae Sai que o treinador do grupo, Ekapol Chanthawong, estudou a técnica por 10 anos antes de assumir o papel na equipe de futebol.

Durante os dias em que permaneceram isolados, Chanthawong ensinou aos meninos a meditarem para mantê-los calmos e preservar a sua energia.

A meditação budista existe há 2.600 anos, desde que o Buda começou a ensiná-la como ferramenta para alcançar clareza e paz de espírito e, em última instância, a libertação do sofrimento, de acordo com a filosofia.

Para além da crença na religião, a técnica que busca manter a atenção aos estímulos internos e externos é amplamente conhecida por auxiliar com os sintomas de ansiedade e estresse.

Em pesquisas mais recentes, cientistas mostraram em contextos clínicos que a meditação mindfulness (uma prática de meditação específica ensinada no budismo tailandês e em outras partes do mundo) pode reduzir até mesmo a depressão e a dor.

O cuidado com a saúde mental após o trauma

Mesmo após o resgate, o grupo de jovens ainda vai enfrentar grandes desafios durante a sua reinserção no mundo fora da caverna.

De acordo com o Departamento de Saúde Mental da Tailândia, os hospitais estruturaram um esquema de cuidados especiais para receber os meninos, que devem permanecer sob atenção constante por pelo menos uma semana, e vão monitorá-los até que sua saúde mental deles esteja totalmente recuperada.

Os médicos também vão trabalhar com as famílias para que elas se preparem para interagir com os meninos de modo que o estresse vivido pelos jovens seja amenizado.

Não houve a necessidade de se buscar um “culpado” pelo evento

Embora o técnico tenha conseguido manter os meninos seguros e calmos dentro da caverna, ele pediu desculpas aos pais dos garotos em uma carta entregue pela marinha tailandesa no sábado (7).

“Para os pais de todas as crianças, agora as crianças estão bem, a equipe está cuidando bem de todos nós. Eu prometo que vou cuidar das crianças da melhor forma possível. Quero agradecer por todo o apoio e quero me desculpar por tudo”, escreveu Ekapol, de acordo com a ABC News.

Apesar de ser o adulto responsável pelo grupo, em nenhum momento o técnico foi culpabilizado pela situação das crianças por parte dos familiares.

Ele era conhecido por ser bem próximo ao grupo e os meninos já estavam acostumados a participar de pequenas aventuras, como natação em cachoeiras, passeios de bicicleta pelas montanhas, rafting e exploração de cavernas.

A mensagem, escrita à mão pelo técnico, estava entre as breves notas compartilhadas pelos garotos após o encontro com a equipe de resgate.

Nos relatos, os meninos disseram que estavam bem e que sentiam saudades da família. A primeira coisa que eles gostariam de fazer assim que saíssem da caverna seria “ir para casa” e “comer muito“.

Em outra carta, um dos garotos pediu a compreensão dos professores para que não acumulassem tantas tarefas de casa.

O respeito as outras famílias e a comemoração apenas quando todos estiverem seguros

De acordo com o jornalista australiano Daniel Sutton, que acompanhou o resgate dos garotos tailandeses, no momento em que os 2 primeiros meninos saíram da caverna não houve gritos ou aplausos, mas muitos “sorrisos“.

A contenção das comemorações do sucesso da primeira etapa da operação se deu, sobretudo, em respeito aos outros garotos e seus familiares que permaneciam isolados. A identidade dos garotos permaneceu sob sigilo até que o último menino fosse retirado em segurança da caverna.

De acordo com Narongsak Osottanakorn, governador da província de Chiang Rai e chefe das operações de resgate, as autoridades tailandesas trabalharam para evitar o vazamento de informações que pudesse prejudicar o resgate ou atingir a sensibilidade das famílias envolvidas.

Por isso, o uso dos celulares no acampamento montado próximo a caverna era limitado e até mesmo o acesso da imprensa era restrito no local.

Apesar da situação tensa, os familiares respeitaram a decisão das autoridades e não buscaram mais informações do que as que eram oferecidas durante o processo de resgate.

De acordo com a BBC, há um ditado na Tailândia que é muito presente na vida dos tailandeses: “Evitarás ofender a quem te ajuda pedindo mais do que este lhe dá“.

Para a cultura local, é um gesto de respeito e agradecimento se contentar com o que é oferecido sem maiores questionamentos.

O apoio e a mobilização da comunidade internacional

A situação dramática vivida pelos garotos sensibilizou o mundo inteiro. Além da atuação dos mergulhadores tailandeses, outros profissionais de países como Austrália e Inglaterra participaram da operação.

O empresário Elon Musk, fundador da Tesla e da SpaceX, até ofereceu um de seus minissubmarinos para participar do resgate. Ele serviria como um segundo plano, caso o nível de água da caverna voltasse a subir.

A homenagem ao mergulhador morto durante o resgate: “Não foi em vão”

Saman Kunan, de 38 anos, morreu na quinta-feira (5) depois de ficar sem oxigênio quando retornava à entrada da caverna. Ele havia levado suprimentos para o grupo e participava da operação de resgate dos garotos.

O mergulhador era ex-integrante do grupo de elite da Marinha e tinha se voluntariado a participar do resgate.

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Brincadeira de criança

Em coletiva de imprensa nesta quarta-feira, o chefe da operação de resgate Narongsak Osottanakorn, disse que os meninos estavam apenas sendo crianças quando se perderam, e que ninguém era culpado. “Não vemos os meninos como culpados ou como heróis. Eles são crianças sendo crianças, foi um acidente”, disse.

Ana Beatriz Rosa, Huffpost

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