Luis Soares
Colunista
Política 11/Set/2010 às 16:37 COMENTÁRIOS
Política

O Twitter e o "jornalismo boca a boca"

Luis Soares Luis Soares
Publicado em 11 Set, 2010 às 16h37

O recente terremoto na Nova Zelândia acrescentou mais um elemento à já longa lista de polêmicas envolvendoo sistema de micromensagens Twitter. O tremor, de 7,2 graus na escalaRichter, foi só um décimo de grau menos intenso do que o do Haiti, e ojornalistas europeus que tentaram obter notícias surfando pelo Twitterde neozalendeses saíram frustrados da experiência.

Eles constataram que a maioria das mensagens envolvia notíciasfamiliares e que o grosso das informações sobre a situação geral vinhade fora do país. Isto reforçou a crítica de que os Twitters nãosão uma ferramenta relevante para os profissionais do jornalismo,confirmando uma experiência feita no início do ano por um grupo decinco repórteres de uma rádio francesa, que se isolou numa fazenda e sótinha acesso ao mundo por meio de mensagens postadas por pessoas comuns.

A polêmica em torno da utilidade jornalística do Twitter aindavai durar muito tempo porque se trata de uma questão complexa cujodebate não pode ser resumido às opções usar ou não usar. É um fatoinquestionável que a esmagadora maioria das mensagens que circulam noTwitter têm a ver com questões pessoais e familiares, porque aferramenta ampliou a sensação de proximidade entre os usuários.

As notícias que circulam na rede são em sua maioria repassadas porusuários para amigos, no recurso chamado Retweet (RT), por meio do quala informação é transmitida de pessoa em pessoa. Este fator humano nacirculação das notícias provoca um fenômeno curioso. Aquantidade de acessos que uma notícia recebe em sua versão original naWeb depende do número de vezes que ela é repassada por usuários doTwitter.

Os twiteiros usam este recurso como uma forma de criar comunidadesem torno de temas de interesse localizado e específico. Outrocomponente importante neste comportamento é a transferência de credibilidade,ou seja, se uma pessoa de minha confiança recomenda uma informação,esta passa também a ser confiável. Parece pouca coisa, mas num ambientede avalancha informativa, a recomendação de amigos passa a serfundamental.

Tudo isto indica que, no Twitter, a notícia jornalística passa a sertratada de uma forma distinta da forma convencional, em que aimpersonalidade é um componente essencial. Claro que você podeconsultar os twits dos veículos jornalísticos convencionais, mas nãosão eles os que detêm os maiores índices de “seguimento” a opção de seguir um usuário para obter todas as atualizações mais recentes de sua página.

Em termos informativos, o Twitter estaria mais próximo do sistema boca a boca doque de uma página de jornal ou noticiário na TV. E é assim que osistema deve ser visto, porque não segue a lógica do jornalismoprofissional. A circulação de notícias no Twitter é desorganizada,descentralizada, horizontal e quase caótica.

Os padrões de credibilidade também não são os mesmos da imprensa masnem por isso o Twitter deve ser descartado como fonte noticiosa. O caosdo Twitter permite uma diversificação de enfoques sobre ummesmo fato, dado ou processo, viabilizando uma contextualização maiscompleta da notícia — coisa bem mais difícil na imprensa pré-internet.

O Twitter também faz uma ligação direta entre produtores denotícias, como é o caso das páginas de jogadores e alguns clubes defutebol e o público. Jornalistas e pessoas comuns usam a mesma fonte,mas a notícia circulada de boca em boca vai mais rápido e mais longe doque a veiculada pela página web do jornal.

A popularização do Twitter criou um problema adicional para as redações.Não basta publicar a notícia. Ela precisa ser recomendada — e istoincorpora um novo agente no processo de circulação de uma informação. Arecomendação de uma notícia escapa ao controle dos profissionais dojornalismo e os obriga a olhar um pouco além da porta das redações.

As observações feitas a propósito do terremoto neozelandês mostramque a notícia pelo Twitter não está associada apenas ao seu valorinformativo, mas também a um conteudo emocional. A veiculação denotícias para os desabrigados pelo temor valeu mais pela sensação desolidariedade do que pela carga informativa.

Estranhos se tornaramíntimos no meio da tragédia, gerando comunidades informativas instantâneas.

A notícia viral, jargão criado pelos estudiosos do fenômeno Twitter,passa a ser o produto informativo criado pelas recomendaçõessucessivas. Neste processo, a teoria do “quem conta um conto aumenta um ponto” sóé parcialmente válida, já que na retwitagem quase sempre é a versãooriginal que é passada adiante. Mas isto não elimina o risco dedistorções.

Carlos Castilho

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