Cinthia Filomeno
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Cultura 26/Mar/2021 às 08:00 COMENTÁRIOS
Cultura

Geovana, a deusa negra do samba está de volta, pisando nesse chão com força.

Cinthia Filomeno Cinthia Filomeno
Publicado em 26 Mar, 2021 às 08h00
Geovana. Foto: Rafael Luvizetto/Coletivo Sindicato do Samba

Cinthia Filomeno*

Pra quem é do universo do samba, Geovana é conhecidíssima do meio, mas, pra quem gosta de samba, mas não conhece as histórias que fizeram muitos nomes estourarem nas últimas décadas na indústria da música nacional, ela é a protagonista de uma trajetória incrível e importantíssima no contexto do gênero no Brasil.

Nascida Maria Tereza Gomes, Geovana cresceu no Morro da Rocinha. Filha de pai senegalês e mãe mineira, ela sempre esteve cercada pela oratória das histórias narradas por seus familiares e acostumou-se a percorrer pelas rodas de samba suburbanas garimpando o melhor da música para o seu trabalho. Fez sua vida nesse meio e foi reconhecida artisticamente pelo nome que carrega até hoje.

A Deusa negra do samba, como é conhecida, é madrinha do grupo do qual faço parte, o Batalhão da Vagabundagem que, diga-se de passagem, de “vagabundos” não temos nada! O grupo é formado por diversos músicos e compositores da nova geração, produtores culturais, poetas e escritores que tem o samba como protagonista da vida e, aos 72 anos, Geovana tem muita energia, muita história pra contar sobre sua trajetória e muito samba na garganta e no pé que contagia toda roda que ela pisa.

Nos anos 1960, Geovana começou a se envolver diretamente com o universo das escolas de samba frequentando a quadra da Imperatriz Leopoldinense e do Salgueiro e, décadas mais tarde, integrou o Grêmio Recreativo de Artes Negras e Escola de Samba Quilombo, fundada pelo imortal Antônio Candeia Filho.

No início da década de 70, a convite de Maria Bethânia, Geovana passou a se apresentar às segundas-feiras nas rodas de samba do Teatro Opinião – polo de resistência política e cultural em meio à ditadura militar. Lá conheceu personalidades como Tereza Aragão, Aluízio Machado, Xangô da Mangueira, Martinho da Vila e Jair Rodrigues, mas foi na Bienal do Samba, em 1971, que ela estreou no cenário musical como cantora e compositora quando defendeu a canção “Pisa Nesse Chão com Força“. O envolvimento cada vez maior com o samba, lhe rendeu entre outras alegrias, a gravação do LP “Quem tem Carinho me Leva” pela gravadora BMG, em 1975.

Neste trabalho, produzido por Rildo Hora, foram incluídas as canções “Pisa Nesse Chão com Força”, “Tataruê”, “Nos Braços do Dia” e “Rosa do Morro”. O LP teve ainda três arranjos do pianista Luiz Eça, mais a composição “Maitá” também de sua autoria e, em 1978, Geovana quebrou vários estigmas ao fazer parte do elenco do documentário “Partideiros”, com roteiro de Nei Lopes, Rubem Confete e Clóvis Scarpino, que também dirige o filme ao lado de Carlos Tourinho. A jovem Geovana aparece ao lado de grandes partideiros como Clementina de Jesus, Aniceto do Império, Candeia, Guara, Geraldo Babão, Martinho da Vila e Wilson Moreira e só em 1988, que ela gravou seu segundo álbum, “Canto pra Qualquer Cantar”.

“A gente faz porque gosta e não tem medo de nada!”

Geovana. Foto: Rafael Luvizetto/Coletivo Sindicato do Samba

Dona de uma visão crítica acirrada, Geovana sempre levantou o debate sobre o machismo no samba defendendo que as mulheres devem estar em todos os espaços que desejarem e que recebam o mesmo tratamento dos homens.

Há três anos, Geovana foi homenageada no documentário “Bambas“ da cineasta e cantora Anná, que explora o protagonismo feminino no contexto do samba paulistano. Também participou da gravação do CD “Atalho“, de Guilherme Lacerda, que compôs as faixas “Meu Coração Pergunta”, “Já Foi Meu Carnaval” e “Venha me Visitar.”

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Com mais de 300 composições, Geovana teve canções gravadas por nomes como Clara Nunes (que gravou um de seus primeiros sambas), Martinho da Vila, Roberto Ribeiro e grupo Fundo de Quintal, da qual o sucesso revelado foi “Irene”, e conviveu com grandes nomes da música brasileira como Pixinguinha, João da Baiana e Elis Regina. E para celebrar os mais de 50 anos de carreira, que marca o lançamento do novo disco “Brilha Sol”, que já se encontra nas plataformas digitais, foi lançado o projeto Geovana – Brilha Sol, na última segunda-feira (22), pelo Coletivo Sindicato do Samba, tendo Camilo Árabe e Guilherme Lacerda na linha de frente, (ambos também do Batalhão), que visa uma temporada de shows com seis apresentações virtuais ao vivo, sempre às segundas-feiras, às 19h, no canal do YouTube da artista: https://www.youtube.com/geovanabrilhasol

Então, não ‘marque bobeira’, não ‘durma no ponto’ e nem ‘pise na bola’ e já coloca na agenda com antecedência que, segunda-feira dia 29, às 19h, é dia de samba! É dia de Gegê. É dia de ver o show da rainha Geovana!

Esse projeto foi contemplado pela Lei Aldir Blanc através da Secretaria de Cultura e Economia Criativa do Estado de São Paulo.

*Cinthia Filomeno é escritora e pesquisadora do samba, autora do livro Samba: Uma Cultura Popular Brasileira

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