Vitor Ahagon
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Direita 03/Jun/2020 às 15:28 COMENTÁRIOS
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Alguns apontamentos sobre a “volta” do antifascismo

Vitor Ahagon Vitor Ahagon
Publicado em 03 Jun, 2020 às 15h28

O antifascismo não é um projeto político, mas é uma política que é compartilhada por anarquistas e socialistas revolucionários, sendo que os movimentos antifascistas que tiveram melhores resultados, foram aqueles que adotaram como tática a Ação Direta

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(Imagens: Reuters)

Vitor Ahagon*, Pragmatismo Político

A mais recente volta do antifascismo, tem a ver com as manifestações nos Estados Unidos contra Trump e o assassinato do George Floyd em Minneapolis e aqui no Brasil contra Bolsonaro e o assassinato de João Pedro no Rio de Janeiro, ambos mortos pelas mãos da polícia.

As manifestações contra o assassinato de Floyd fez explodir toda a raiva reprimida da população estadunidense e por mais que houvessem muitas pessoas que não concordassem com as “táticas violentas” – e aqui poderíamos lembrar da frase de Malcolm X, “não confunda a reação do oprimido com a violência do opressor”, mas essa discussão fica para um outro momento – muitos cidadãos estadunidenses simpatizam com a explosão de raiva por trás do tombamento de viaturas policiais e da destruição das fachadas de lojas nas cidades do país, como nos relata o historiador Mark Bray, escritor do livro Antifa: O Manual Antifascista, publicado pela editora Autonomia Literária.

Aqui no Brasil, as manifestações contra Bolsonaro, chamadas por grupos antifascistas das torcidas organizadas do Corinthians, Palmeiras e outros times, seguem as mobilizações do movimento negro e de favelas do Rio de Janeiro que a partir de um ato online, expressaram toda a indignação com o assassinato de João Pedro Matos de apenas 14 anos. O evento teve a participação de muitas pessoas e familiares, na ocasião Douglas Belchior da Uneafro e Coalizão Negra por Direitos, disse: “Não podemos aceitar que famílias negras continuem a ser despedaçados pela brutalidade policial, pela violência do estado e por um genocídio que nunca termina”.

A raiva que muitos sentem nos Estados Unidos são sentidas também aqui no Brasil, pois a mesma dor e sofrimento são partilhados por esses países que tiveram a escravidão como uma cicatriz que ainda está aberta e sangra todos os dias. Portanto, a volta do anfifascismo aqui e lá tem um elemento político, mas também racial. Por isso, a luta antifascista é fundamentalmente também uma luta antirracista.

Outra elemento importante de se colocar nessa equação é a briga entre os governadores e os presidentes, tanto lá quanto cá. Na treta de lá, diante dos dias e dias seguidos de manifestações em diversos estados do país, Trump colocou em uma vídeo-reunião que os governadores que não estão sabendo lidar com as manifestações são “fracos” e cobrou deles que “dominem” os manifestantes e se caso não consigam, Trump irá convocar a Lei de Insurreição de 1807, que segundo o doutor em Filosofia e Teoria Geral da Lei pela USP, Silvio Almeidaé uma espécie de intervenção militar, uma GLO, como ocorreu no RJ” para reprimir as manifestações contra o racismo nos Estados Unidos.

Aqui no Brasil, Bolsonaro briga com os governadores em relação ao isolamento social. Na famosa reunião ministerial de 22 de abril, Bolsonaro chamou Dória de “bosta” e Witzel de “estrume”, políticos estes que quando das eleições apoiaram e tiveram o apoio de Bolsonaro, mas agora em meio à pandemia essas figuras abjetas se colocam como oposição ao governo.

Dória porque já está em campanha para as eleições presidenciais de 2022 e Witzel porque, segundo Ricardo Antunes, está sendo investigado pelo serviço de inteligência paralelo de Jair Bolsonaro atrás de algum esquema de corrupção a partir de contratos fechados pelo estado carioca. Obviamente que Dória e Witzel não são antifascistas, muito pelo contrário, fazem parte da direita que disputam o poder com o bolsonarismo, mas acabam por fragilizar mais ainda a imagem do presidente.

Falando nisso, os dois presidentes estão com o índice de rejeição nas alturas, Trump com 53,9% e Bolsonaro com 43%. Estes péssimos índices de aprovação tem a ver com a maneira que os dois presidentes lidaram, e continuam lidando, com a pandemia do COVID-19. Trump no dia 24 de abril, sugeriu injetar alvejante no corpo de pessoas contaminadas para combater o vírus, fora isso, dizia que o uso da cloroquina poderia ser usado como método preventivo, dizendo que mesmo ele já estava tomando o remédio (o que foi suspenso depois da divulgação pela mídia de estudos que diziam que o remédio não tinha o menor efeito ao combate do vírus, fora ser perigoso por seus efeitos colaterais).

Bolsonaro, que mais parece um papagaio de Trump, possui a mesma defesa da cloroquina, esta posição fez com que entrasse em rota de colisão com os ministros da saúde, Mandetta e Teich, acabando por chutar os dois, deixando um militar no cargo. Apesar desses dois ministros terem sido favoráveis ao desmonte do SUS antes da pandemia, a posição de médicos não lhes permitiu assumir a posição do presidente, sendo esses embates muito desgastante para Bolsonaro. Mas o pior golpe veio depois da saída do ministro da justiça Sérgio Moro e a divulgação do vídeo da reunião ministerial de 22 de abril. Mesmo dentro do governo que ele mesmo montou, Bolsonaro se mostra incapaz de controlar seus ministros.

Até mesmo a grande mídia vêm divulgando as últimas manifestações como pró-democracia contra os presidentes Trump e Bolsonaro. A relação que ambos os presidentes possuem com a imprensa televisiva ou impressa não é a das melhores há muito tempo e no caso específico do Brasil, o debate em torno das fake news e as acusações feitas em torno do gabinete do ódio, desgastam ainda mais o governo e o clã Bolsonaro como um todo. É sintomático que cerca de 90% dos eleitores brasileiros apoiam a regulamentação das redes sociais para o combate às fake news, tendo em vista que quase toda a estratégia midiática de Bolsonaro ser pelas redes sociais com objetivo de causar, no mínimo, confusionismo em relação a vários debates.

Enfim, e nos últimos dias vemos várias bandeiras antifascistas se multiplicar em todas as redes sociais em todas as cores. Por um lado isso é muito bom, pois o antifascismo chega em pessoas que ainda não havia atingido, por outro, corre-se o risco da banalização, portanto sempre é bom retomar a história.

Lembremos que na França, o mesmo liberal que se colocou como antifascista na ocupação nazista na segunda guerra, foi o liberal que massacrou com o seu porrete o povo argelino na luta pela independência. Não, liberal não é antifascista, pois o antifascismo é anticapitalista.

O antifascismo não é um projeto político, mas é uma política que é compartilhada por anarquistas e socialistas revolucionários, sendo que os movimentos antifascistas que tiveram melhores resultados, foram aqueles que adotaram como tática a Ação Direta, dissolvendo reuniões e meetings, como ocorreu em SP com a revoada dos galinhas verdes em 1934 na praça da Sé. O mínimo que todo militante ou ativista de esquerda deve ser é antifascista, mas lembrando que para ser “anti” temos que entender o que é fascismo.

Em linhas gerais, o fascismo é o apagamento do indivíduo no Estado, a manutenção e conciliação das classes sociais pelo corporativismo e a manutenção dos privilégios de raça, gênero e sexualidade. Portanto, se o fascismo é isso, o antifascismo deve ser anticapitalista, antiestatal, antipatriarcal, antilgbtfóbico, antirracista ou não será.

*Vitor Ahagon é professor de História e membro da Biblioteca Terra Livre.

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