Empresários obrigam funcionários a se ajoelhar por reabertura do comércio
Obrigados pelos patrões, que permanecem isolados, empregados foram às ruas de Campina Grande pedir a reabertura do comércio e se colocaram em situações humilhantes. Cena se repetiu em Santa Catarina. Ministério Público abre investigação
Empresários de Campina Grande (PB) determinaram que seus funcionários ocupassem as principais ruas do comércio da cidade na última segunda-feira (27) para pedir o fim do isolamento social e o retorno das atividades econômicas.
As cenas são constrangedoras e alguns trabalhadores tiveram de se ajoelhar no chão. Uma funcionária disse, em condição de anonimato, que sabia dos riscos da exposição e reconheceu a situação ultrajante, mas “não podia desobedecer o patrão” porque “precisa muito do emprego”.
O Ministério Público do Trabalho (MPT) da 13ª Região instaurou um procedimento investigatório para apurar se houve coação e constrangimento na convocação do ato.
“Temos que apurar como se deu essa convocação, com que argumentos e finalidades. Já despachei, dentro do processo, algumas providências, como o pedido por documentos e a realização de audiência com o sindicato de trabalhadores”, contou a promotora Andressa Lucena.
O Sindicato dos Comerciários de Campina Grande foi a entidade que repassou as primeiras denúncias ao MPT, mas desde o anúncio da abertura do processo de apuração, Lucena conta que outras reclamações de trabalhadores chegaram.
“Recebemos denúncias anônimas de que os patrões teriam ameaçado fazer demissões. Acompanhando o ato, vimos ainda que estava sendo coordenado pelo setor empresarial, que pedia que os presentes fizessem isso e aquilo. Houve também aglomeração de pessoas, o que não é recomendado. O nosso posicionamento vai neste sentido: que sejam seguidas as orientações da Organização Mundial da Saúde e do Ministério da Saúde, e o comércio não reabra agora — afirmou José Nascimento Coelho, diretor do Sindicato dos Comerciários.
Segundo o advogado Pedro Paulo Sodré, especialista em Direito do Trabalho pela Universidade de São Paulo (USP), as denúncias e o comando do protesto pelos lojistas evidenciam a coação.
“A coação aparece no Direito como a ideia de forçar alguém a realizar algo contra sua vontade. No caso do Direito Trabalhista, a ameaça nem precisa ser direta. Pois há diversos subterfúgios, como patrão, para que os empregados se sintam obrigados a fazer algo, para não serem demitidos. Neste caso, ainda há o agravamento de que eles foram expostos a uma situação de risco de contágio ao coronavírus”, explicou.
O advogado Anderson Henrique Resende compartilha da opinião e acrescenta: “Caso o ato se repita e seja apurado que a manifestação ocorreu a mando do superior hierárquico, poderíamos falar em assédio moral”.
O prefeito de Campina Grande, Romero Rodrigues, chegou a anunciar a reabertura gradual do comércio da cidade no dia 20 de abril, mas voltou atrás após receber recomendações dos ministérios públicos Federal, estadual e do Trabalho em sentido contrário.
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Santa Catarina
A exemplo de Campina Grande, a cidade de Lajes, em Santa Catarina, também registrou um movimento semelhante, com funcionários obrigados pelos patrões a pedir a reabertura do comércio nas ruas. Saiba mais aqui.