Redação Pragmatismo
Ditadura Militar 22/Abr/2019 às 20:14 COMENTÁRIOS
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Bolsonaro assina decreto que impede trabalho em ossadas de Perus

Publicado em 22 Abr, 2019 às 20h14

Bolsonaro encerra grupos de trabalho que buscavam identificar vítimas da ditadura. Equipe técnica investigava ossadas achadas em Perus (São Paulo) e no Araguaia (Pará/Tocantins)

vala de perus bolsonaro
Vala de Perus (imagem: Reprodução/247)

Dois grupos de trabalho (GTs) que atuavam na identificação de corpos de vítimas da ditadura civil-militar foram extintos pelo presidente Jair Bolsonaro (PSL).

Os grupos Perus e Araguaia foram atingidos pelo Decreto 9.759, assinado no último dia 11, que extingue conselhos e órgãos colegiados ligados à administração federal e visa acabar com a participação popular no governo federal.

O GT Perus era responsável pela identificação das ossadas encontradas numa vala clandestina no cemitério de mesmo nome, na zona noroeste da capital paulista, descoberta em 1990. Já o GT Araguaia fazia trabalho equivalente em relação aos restos mortais dos integrantes da guerrilha que enfrentou o Exército e a ditadura durante três anos na floresta amazônica, na região entre os estados do Pará e Tocantins (na época, Goiás), na década de 1970.

Ambos os grupos estavam vinculados à Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos, do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, e os trabalhos de identificação atendiam a determinação da Justiça Federal.

“Mais do que enterrar os desaparecidos, o governo está implodindo todo um sistema voltado à justiça”, disse a procuradora regional da República Eugênia Gonzaga, que preside a comissão ao jornal O Estado de S. Paulo nesta segunda-feira (22).

A comissão foi criada por lei federal e não pode ser extinta por decreto, mas os GTs atingidos paralisam os trabalhos de identificação.

“Embora haja verba prevista e determinação judicial para que o trabalho seja feito, não há ninguém hoje que possa assinar um documento ou contratar quem quer que seja para realizar os trabalhos”, detalha a procuradora.

O trabalho de identificação das vítimas da ditadura sempre foi ridicularizado pelo presidente Bolsonaro. Enquanto deputado, ele mantinha numa das paredes de seu gabinete o cartaz que dizia que quem procurava osso era cachorro, em referência aos trabalhos do GT Araguaia.

Já o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, comandado por Damares Alves, apenas disse que “está avaliando, estudando e proporá algo dentro dos parâmetros do decreto”, mas não garantiu a continuidade do trabalho de identificação das ossadas.

Em fevereiro de 2018, foi identificada a ossada de Dimas Antônio Casemiro, militante e dirigente do Movimento Revolucionário Tiradentes (MRT), morto em abril de 1971 em São Paulo, aos 25 anos, e enterrado como indigente em Perus.

Em dezembro do mesmo ano, o GT Perus também identificou os restos mortais de Aluízio Palhano Pedreira Ferreira, militante morto no mesmo ano, no DOI-Codi de São Paulo, comandado à época por Carlos Alberto Brilhante Ustra, ídolo de Bolsonaro.

São mais de mil caixas com ossadas que, depois de um período de abandono, passaram a ser investigadas pelo GT Perus, em trabalho realizado em parceria entre Comissão de Mortos e Desaparecidos Políticos, as secretarias nacional e municipal de Direitos Humanos, a Comissão Especial e a Universidade Federal de São Paulo. Dessa parceria, surgiu o Centro de Antropologia e Arqueologia Forense (Caaf), responsável pela análise do material.

Confira a linha do tempo desde a descoberta da vala de Perus:

1990: Local é descoberto em 4 de setembro e Prefeitura de São Paulo exuma mais de 1000 sacos plásticos contendo as ossadas;

1990: Trabalho de identificação é iniciado no departamento de Medicina Legal da Unicamp;

1994: Análises são interrompidas;

1998: Verificou-se a má conservação dos ossos, que ficaram armazenados em péssimo estado de conservação, empilhados em uma sala, com carteiras escolares em cima dos sacos, além de estarem molhados devido a uma inundação ocorrida no local;

1999: Ministério Público Federal (MPF) interveio e em setembro foi instaurado na Procuradoria da República em São Paulo o Inquérito Civil Público nº 06/99, para apurar o lento andamento dos trabalhos na identificação das ossadas;

2001: Com a intervenção do MPF, a Secretaria de Segurança Pública providenciou a transferência das ossadas da Unicamp para o Instituto Médico Legal, para prosseguimento dos trabalhos sob a responsabilidade da Universidade de São Paulo (USP);

2002: As ossadas são transferidas para o Cemitério do Araçá;

2006: Trabalhos da USP são paralisados;

2009: Paralisação levou ao ajuizamento de ação civil pública pelo MPF em São Paulo;

2014: CAAF recebe as 1.047 caixas e análise é assumida pelo Grupo de Trabalho Perus.

2017: Mais da metade das caixas tiveram seu conteúdo limpo e analisado e amostras de ossadas são enviadas para laboratório na Bósnia.

2019: Mais de 900 ossadas limpas e examinadas.

informações da RBA

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