Sobre negros, violência e salários
Passados 125 anos da abolição da escravatura e a realidade da maior parte dos negros no Brasil continua a ser a exclusão e a exploração. Esse sofrimento é refletido em números de homicídios, salários e de educação formal
No dia 20 de novembro comemora-se o Dia da Consciência Negra. Este ano o assunto tomou destaque por várias câmaras municipais terem votado a sua oficialização como feriado e ter sido anulado, tal como em Curitiba, com o TJ-PR derrubando a lei por pressão da Associação Comercial do Paraná (ACP), que alegou perda de lucros, se houvesse tal feriado.
Já se passaram 125 anos da abolição da escravatura, mas a sociedade brasileira ainda sofre com imensos resquícios de uma realidade onde o negro é excluído e ainda mais explorado, com os reflexos em números de homicídios, salários e de educação formal. Vejamos alguns números referentes a isto.
Os negros e a violência
Segundo o Mapa da Violência 2012, no ano de 2010, a quantidade de pessoas negras vítimas de homicídios foi de 71,1% do total, enquanto que o de brancas foi de 28,5%. Mas o que mais impressiona é o seu crescimento. De 2002 a 2010, os homicídios na população branca caíram 25,5%, enquanto que na população negra houve um crescimento de 35,3%.
Se formos para a população jovem, esta proporção continua parecida. Enquanto que a juventude branca teve um decréscimo de 33% nos homicídios, a juventude negra sofreu um crescimento de 23,4%.
Os estados, segundo o Mapa, onde apresentam maiores taxas de homicídios de negros, no Brasil, são Alagoas, Espírito Santo e Paraíba, respectivamente.
Os negros e os salários
Já neste ponto utilizarei os dados compilados no belo trabalho do DIEESE, lançado neste mês, chamado de “Os negros no mercado de trabalho” e que pode ser acessado em seu sítio.
Segundo este estudo, que utiliza os dados do PED, coletados pela própria entidade nas sete maiores metrópoles do país, enquanto que em 2012 os não negros tiveram uma taxa de desocupação de 9,2%, os negros tiveram 11,9%. Se fosse uma mulher negra a coisa estava ainda pior, pois a taxa subia para 14,1%.
Mas o que mais impressiona não é a diferença de desocupação, e sim a diferença salarial. Os não negros tiveram, no biênio 2011-2012, uma diferença salarial enorme. O rendimento dos negros equivaleu a 63,89% dos não-negros, como pode ser visto na tabela abaixo.
O mais assustador, nesta tabela, é que Salvador, uma das cidades com maior presença negra do país, é a que paga menos aos negros, relativamente aos brancos. O negro tem um rendimento de apenas 59,86% de um branco, na capital baiana!
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Algumas variáveis podem explicar estas diferenças. Os negros ocupam, normalmente, postos de trabalho com menor remuneração, como a construção civil, enquanto que os brancos têm maior presença, por exemplo, no setor de indústria de transformação. Sem considerar, ainda, os cargos que ocupam dentro de cada setor. Para ilustrar, das capitais pesquisadas, só em Porto Alegre que verificou-se uma maior presença de não-negros na categoria “pedreiros, serventes, pintores, caiadores e trabalhadores braçais na construção”.
Outra variável explicativa pode ser o nível educacional. Segundo dados da Pnad 2011, enquanto que 35,8% dos estudantes entre 18 e 24 anos negros estavam no nível superior, para os brancos este número quase que dobrava, indo para 65,7%. Já para o ensino fundamental a relação era contrária, 11,8% para a população de estudantes nesta faixa-etária negra, e 4,5% da branca, o que demonstra o atraso educacional imensamente maior para os negros, relativo aos brancos.
Ainda parece ser pouco um dia da consciência negra
Diante de tantos números que comprovam que no Brasil o abismo entre negros e brancos ainda é enorme, é estranho causar polêmica um dia de luta contra tudo isto. Em um país de Danilos Gentilis e Rafinhas Bastos, que ainda demonstram seus primitivismos que denominam como comédia baseado em reproduções de racismo, homofobia, machismo e todas as opressões possível, é imediata a necessidade de uma data que seja exclusivamente dada ao combate do racismo.
*Eric Gil é economista do Instituto Latino-americano de Estudos Socioeconômicos (ILAESE) formado pela Universidade Federal da Paraíba, mestrando no Programa de Pós-graduação em Ciência Política da Universidade Federal do Paraná; escreve quinzenalmente para Pragmatismo Político