Luis Soares
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Ditadura Militar 11/Ago/2012 às 19:22 COMENTÁRIOS
Ditadura Militar

Professora da USP morta pela ditadura pode ter demissão anulada

Luis Soares Luis Soares
Publicado em 11 Ago, 2012 às 19h22

Ana Rosa foi sequestrada com seu marido, o físico Wilson Silva, em 22 de maio. Segundo relata o professor e jornalista Bernardo Kucinski, irmão dela, eles foram raptados no momento em que celebravam quatro anos de casamento

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Movimento quer anular demissão de Ana Rosa, professora morta pela ditadura. Foto: desaparecidospoliticos.org.br

Rede Brasil Atual

O Fórum Aberto pela Democratização da USP deseja que a universidade anule a demissão por “abandono de função” de Ana Rosa Kucinski Silva, sequestrada e assassinada em 1974 pelos órgãos de repressão da ditadura (1964-85).

Ana Rosa era professora do Instituto de Química (IQ) da Universidade de São Paulo e integrante da Ação Libertadora Nacional (ALN), uma organização de guerrilha urbana que lutava contra o regime. Em 1975, a congregação do instituto em que ela lecionava a demitiu, ignorando seu desaparecimento forçado.

O fórum, que reúne a Associação de Docentes da USP (Adusp), o Sindicato dos Trabalhadores da USP (Sintusp) e 26 entidades estudantis e associações, vai realizar uma manifestação na segunda-feira (13) em frente ao instituto exigindo uma revisão do caso de Ana Rosa.

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A professora da Faculdade de Letras, Filosofia e Ciências Humanas da USP Elisabetta Santoro, vice-presidenta da Adusp, afirmou que a demissão simboliza como a universidade age em relação ao seu histórico com a ditadura. “É emblemático. Até hoje, a universidade não reverteu uma atitude que foi baseada em mentira”, disse ela. Para Elisabetta, a manifestação busca informar os atuais estudantes que não conhecem o passado da instituição sobre o envolvimento dela com a ditadura.

Queremos fazer jus à memória e à verdade, precisamos saber o que de fato ocorreu e avaliar a postura da universidade, que condescendeu com a repressão. Se revermos suas atitudes desse período, podemos fazer luz ao passado, avaliar nosso presente e planejar nosso futuro”. Ela ainda comentou que a manifestação deseja que o IQ seja batizado com o nome de Ana Rosa.

Ana Rosa foi sequestrada com seu marido, o físico e também guerrilheiro Wilson Silva, em 22 de maio. Segundo relata o professor e jornalista Bernardo Kucinski, irmão dela, eles foram raptados no momento em que celebravam quatro anos de casamento.

Graduada em química e doutora em filosofia, ela era uma das mais jovens professoras do IQ e desapareceu aos 32 anos. Ela e o marido teriam sido raptados pelo delegado do Departamento de Órdem Política e Social (Dops) Sérgio Pastranhos Fleury, passado um dia presos em São Paulo e então transferidos para a chamada “Casa da Morte” em Petrópolis, no Rio de Janeiro, onde, após serem torturados, teriam sido assassinados pouco dias depois, de acordo com um depoimento feito pelo ex-cabo do Exército José Rodrigues Gonçalves à jornalista Mônica Bergamo, para uma reportagem da revista Veja, em 1993.

A reportagem de Mônica nunca foi publicada, mas Bernardo obteve dela uma cópia do material, segundo relatou à Rede Brasil Atual em maio deste ano, quando comentou a confissão do ex-delegado Cláudio Guerra, publicada no livro Memórias de uma guerra suja, dos jornalistas Marcelo Netto e Rogério Medeiros. Guerra afirmou que o corpo de Ana Rosa foi incinerado na Usina Cambahyba, no Rio de Janeiro.

Em 1995, a Lei 9.140 incluiu o nome de Ana Rosa na lista oficial das 136 pessoas que se encontravam desaparecidas em razão de participação, ou acusação de participação, em atividades políticas, entre 2 de setembro de 1961 e 15 de agosto de 1979, e detidas por agentes públicos. A Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos (CEMDP), instituída pela mesma lei, declarou que Ana Rosa foi vítima do Estado brasileiro. No entanto, até agora a USP não tomou qualquer medida para reverter a demissão por justa causa de Ana Rosa.

O Fórum Aberto pela Democratização da USP procura instaurar uma Comissão da Verdade na universidade para investigar a relação da instituição com a Ditadura. “Há ainda coisas na USP que são heranças de um passado submerso, enterrado por muitos”, comentou Elisabetta.

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