Luis Soares
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Ditadura Militar 07/Ago/2012 às 20:53 COMENTÁRIOS
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Avós da Praça de Maio recuperam 106º neto e comemoram; restam 394

Luis Soares Luis Soares
Publicado em 07 Ago, 2012 às 20h53

Estamos no caminho para aliviar a dor, diz Avó da Praça de Maio após restituição de outro neto. Associação anunciou nesta terça-feira a identificação do 106º neto sequestrado durante a ditadura

avós praça maio

106º neto é recuperado por Avós da Praça de Maio

As Avós da Praça de Maio anunciaram na tarde desta terça-feira (07/08) a identidade do 106º neto recuperado pela associação. Trata-se de Pablo Javier Gaona Miranda, de 34 anos, que foi sequestrado em maio de 1978, com um mês de vida. Cerca de 400 bebês, entregues a outras famílias durante a ditadura do país (1976-1983), continuam sem conhecer sua verdadeira origem.

“Temos alegria de anunciar que um novo neto foi liberado da tortura que é viver na mentira”, diz Estela de Carlotto, presidente das Avós da Praça de Maio. Segundo ela, o bebê foi entregue a um casal que o adotou como filho próprio. A pessoa que o entregou à família, primo do homem que viria a ser ilegalmente pai de Pablo Javier, era um coronel aposentado, que passou a ser seu padrinho.

Filho de Ricardo Gaona Paiva, de nacionalidade paraguaia, e María Rosa Miranda, argentina da província de Tucumán, ambos integrantes do ERP (Exército Revolucionário do Povo), Pablo Javier sempre soube que não era filho biológico da família que o criou. Segundo Estela, no entanto, “a história que lhe contavam é que o tinham trazido da província de Misiones [localizada na fronteira com o Brasil]”.

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“No dia 13 de abril de 1978, no Hospital Rivadavia, Pablo Javier nasceu. Em 14 de maio de 1978, a família saiu de seu domicílio na cidade de Buenos Aires e se dirigiu à Villa Martelli, para a casa dos pais de Paiva, onde se reuniram para comemorar o aniversário da independência do Paraguai. Se despediram e nunca mais se soube deles”, detalhou a Avó

Segundo ela, Pablo Javier começou a questionar sua verdadeira origem em 2001. Em 2008, manifestou as dúvidas à mulher que o criou e esta, após alguma resistência, confirmou sua apropriação (termo usado para a adoção ilegal de bebês na ditadura). Ao realizar o exame de DNA, há um mês, através da Conadi (Comissão Nacional pelo Direito à Identidade), o jovem confirmou as suspeitas: seu material genético apresenta 90% de coincidência com o da família do casal desaparecido.

“Pablo Javier esteve um mês com sua mãe e com seu pai. Ele, como o resto dos nossos netos, certamente guarda em sua memória interior a lembrança destes dias que terminaram de forma abrupta quando foi separado deles. Esta dor profunda só pode ser curada com a verdade. A verdade é a única explicação capaz de por fim ao tormento de viver sem saber quem se é”, concluiu.

Apesar de expressar contentamento pela restituição de mais um neto desaparecido, Estela lamentou que a luta de 35 anos das Avós da Praça de Maio continue sendo “dolorosa e desesperada”. “Muitas de nós se foram sem poder abraçar seu neto ou neta”, afirmou, “mas agora temos o agravante de que nosso tempo está acabando”.

Netos desaparecidos

Estima-se que 500 bebês tenham sido apropriados ilegalmente na época da ditadura. Muitos deles nasceram em maternidades clandestinas improvisadas para serem entregues a outras famílias, geralmente de militares ou relacionadas a eles. Neste ano, o primeiro presidente da ditadura, Jorge Rafael Videla, foi condenado a 50 anos de prisão pelo Plano Sistemático de Roubo de Bebês.

“A execução deste plano foi possível não só pela quase inconcebível crueldade dos militares da ditadura, mas também pela anuência de uma sociedade que já amparava, desde antes, a prática da apropriação de menores”, afirmou Estela, convocando a que jovens argentinos que tenham dúvidas a respeito de sua verdadeira origem procurem a associação, “como Pablo Javier, que teve a valentia de enfrentar seus medos, sentimentos contraditórios e um destino que lhe foi imposto à força”.

Segundo ela, resolver as dúvidas é o caminho para começar a aliviar tanta dor. “Quem conhece alguém que tenha dúvidas ou que já saiba que pode ser filho de desaparecidos, pedimos que os ajudem a se aproximar da associação das Avós da Praça de Maio ou aa Conadi, para realização de exames de DNA”. “As Avós, como há 35 anos, continuamos procurando e esperando vocês”, concluiu.

Opera Mundi

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