Luis Soares
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Política 29/Abr/2011 às 00:19 COMENTÁRIOS
Política

Dissidentes tucanos esclarecem razões da debandada: "PSDB é raivoso"

Luis Soares Luis Soares
Publicado em 29 Abr, 2011 às 00h19
Perdem o bico, mudam de partido mas o DNA é o mesmo: conservador
O grupo de vereadores que decidiu deixar as fileiras do PSDB em São Paulo publicaram nesta quinta-feira (28) uma carta na qual expõem as razões da debandada. No documento, eles não citam nenhum nome, mas referem-se claramente ao grupo liderado pelo governador Geraldo Alckmin como responsável pela “arenização do PSDB” que os levou a abandonar o partido.
Segundo os dissidentes, o PSDB mudou para pior e acabou se transformando em “um simplório agrupamento voltado à conquista e à manutenção do poder”.

O texto diz ainda que a crise “que culminou com o afastamento de metade da bancada de vereadores de São Paulo começa em uma mistificação formulada em 2008 por uma facção do PSDB”.  Naquele ano, o então ex-governador Geraldo Alckmin, rebelando-se contra a orientação dada por José Serra, bateu o pé e conseguiu aprovar sua candidatura à prefeitura paulistana. Serra não consegiu impedir a candidatura de Alckmin e, nos bastidores, apoiou abertamente a reeleição de Gilberto Kassab, que acabou vencendo a disputa.

Nesta quarta-feira (27), uma notinha plantada na seção Painel, da Folha de S. Paulo, dava o tom de beligerância entre os grupos serrista e alckmista dentro do PSDB. “No entorno de Geraldo Alckmin, firma-se a convicção de que José Serra não seria ‘apenas espectador‘ da debandada de tucanos rumo ao PSD de Gilberto Kassab. Não que se atribua ao ex-governador a coordenação de todos os movimentos em curso ou, antes disso, a elaboração de um plano para desidratar seu próprio partido. Alckmin e aliados, porém, acreditam que Serra não somente sabe mais do que aparenta sobre as negociações conduzidas pelo prefeito de São Paulo como, em pelo menos alguns casos, foi consultado e pouco ou nada fez para evitar a dissidência”, diz a notinha do Painel.
 

A carta dos dissidentes praticamente oficializa a saída deles do PSDB. Segundo o vereador Juscelino Gadelha, um dos que assinam o documento, os dissidentes do PSDB já decidiram para que partidos vão. Um deles vai para o PSB, dois para o PSD e outros dois ainda negociam a entrada no PV. Juscelino optou por voltar ao PMDB, ao qual foi filiado entre 1998 a 2003. Todas estas legendas dão apoio ao prefeito Gilberto Kassab na Câmara Municipal de São Paulo.

Junto com os seis vereadores, também deixou o PSDB paulista o ex-secretário de Esportes da Prefeitura paulistana e cofundador do partido, Walter Feldman.

Ameaçados

Outro tucano que avalia sua saída do PSDB é o ex-deputado estadual Ricardo Montoro. Ele admitiu à imprensa a disposição em deixar a legenda nos próximos dias. Filho de Franco Montoro, que foi governador do estado e um dos fundadores do partido, Ricardo diz se sentir esquecido e ameaçado pelas lideranças paulistas. “Não quero cargo, quero um pouco de atenção”, disse Montoro.

“O grupo que está começando a dominar o partido é raivoso, ameaça o futuro político das pessoas, não aceita divergências”, disse o ex-deputado, referindo-se ao grupo do governador Geraldo Alckmin.

Leia, abaixo, a íntegra do documento assinado pelos vereadores Dalton Silvano, Gilberto Natalini, Juscelino Gadelha, Ricardo Teixeira, Souza Santo e José Police Neto. Police Neto é também o atual presidente da Câmara Municipal de São Paulo. Todos têm alguma relação de proximidade com José Serra.

A arenização do PSDB

O PSDB mudou: mais do que destruir a sua concepção original, o partido adota caminhos que abominava e considerava nocivos ao país.

Uma das primeiras frases do programa de fundação do PSDB assinala: “Se muitos de nós decidimos deixar as agremiações a que pertencíamos, e com as quais nos identificamos ao longo de toda uma trajetória de lutas, é porque fatos graves nos convenceram da impossibilidade de continuar defendendo de maneira consequente aquilo em que acreditamos, dentro do atual quadro partidário”.

A frase é a definição básica de um partido que não pretendia – ou não deveria – ser um simplório agrupamento voltado à conquista e à manutenção do poder, mas uma forja de ideias, preocupada em melhorar efetivamente a vida dos cidadãos do país.

Assim como os fundadores do PSDB perceberam, há 23 anos, a arenização da grande frente democrática que foi o MDB/PMDB, o cenário atual nos remete à síntese do compromisso firmado na fundação do partido, em 1988, um tempo em que se acreditava que “as palavras de um programa nada valem se não forem acompanhadas de ação”.

A arenização do PSDB paulista tem grande similaridade com a arenização do PMDB. Diagnosticavam à época os tucanos fundadores: “Receoso de enfrentar suas divergências internas, (o PMDB) deixou de tomar posição ou mesmo de debater as políticas de governo a que deveria dar sustentação”. Tudo muito parecido com o que ocorre hoje com o PSDB paulistano.

A crise que culminou com o afastamento de metade da bancada de vereadores de São Paulo começa em uma mistificação formulada em 2008 por uma facção do PSDB.

À época, a maioria dos vereadores defendeu um programa construído e executado majoritariamente pelo PSDB. Mas aquela facção acreditava que o mais importante era uma candidatura própria, (mal) sustentada por um programa elaborado pelo marqueteiro de plantão. O eleitorado rechaçou essa visão pobre da política.

De lá para cá, se o PSDB tivesse sido capaz de aprofundar o debate interno, a unidade partidária fundada em princípios teria sido restaurada. Mas aquela mesma facção preferiu invocar agora, sem disfarces, uma postura de vingança, que, em recente reunião do diretório municipal, chegou a pregar ameaças de violência física contra seus oponentes, cuja tese fora vitoriosa no ano de 2008.

O PSDB mudou. Mais do que destruir sua concepção original, o partido agora adota caminhos que antes abominava e considerava nocivos ao país. Perde a credibilidade como defensor da democracia – já que nem sequer consegue praticá-la dentro de casa – e do debate político, visto que sugere resolver divergências de seus parlamentares “a peixeiradas”.

Essa realidade distorcida queima as caravelas, derruba todas as pontes que poderiam levar a uma elevada discussão política e de ideais. Para os que ainda acreditam no ideário expresso no programa de 1988, tornou-se impossível conviver com a arenização tucana.

A substituição do debate político pelo facciosismo pessoal leva à pura intransigência, como diz o ex-presidente do diretório municipal e condutor do processo sucessório municipal, José Reis Lobo: “O que houve foi mesmo intolerância e incompreensão de um pessoal que sempre faz política com raiva, movido por espírito belicoso, de revanche, de vingança, e que nunca cede aos apelos da razão”.

Este é um caminho inexorável de perdas. Que efeito esse conjunto de coisas terá sobre o cidadão-eleitor, a quem cabe legitimar os princípios que regem nossas ações?

Engana-se quem acredita que a frágil cantilena de belas palavras será capaz de seduzir a todos e impor uma embriaguez coletiva. O cidadão que cala é o mesmo que se afasta em busca de um novo ideal político, mais coerente e menos recheado de vaidades.

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