Categories: Política

Propósito

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Eduardo Bonzatto*, Pragmatismo Político

Para o pensamento de esquerda em sua versão atual, a melhoria do mundo depende do indivíduo.
Misturando religiosidade marxiana com policromias indianas ancestrais, o pensador projeta no futuro ações do presente como uma relação causal e caudal que terá efeitos do futuro.

A emissão de atitudes coletivas se tornou um mantra a justificar o presente.

A mais recente formulação está num curso oferecido como pós-graduação para a melhoria global e individual que precisa ser estudada para se confirmar no futuro.

Vamos à teoria:

“Há um bom tempo que a felicidade vem sendo estudado por diferentes campos do conhecimento, como a psicologia positiva e a neurociência. São muitas as vertentes desse conhecimento, mas um entendimento ao qual se chegou é que a felicidade tem duas dimensões: uma individual e outra coletiva.

A felicidade individual possui três estágios. O primeiro é o estágio do prazer positivo, é quando nos reconectamos com as coisas que gostamos de fazer e nos fazem bem. Dançar, desenhar, estar na natureza, ver um pôr-do-sol e assim por diante.

O segundo estágio é quando conseguimos ancorar a nossa consciência do dia a dia em emoções mais elevadas, como a alegria e a aceitação. Esse estágio permite que possamos atravessar os altos e baixos da vida com mais equanimidade.

Já o terceiro estágio é aquele em que experimentamos que a vida faz sentido, é um preenchimento interno que nos motiva a acordar todos os dias com disposição. E o que nos traz isso é o afinamento com a nossa verdadeira natureza, com o nosso propósito de vida, que é também o programa da nossa alma, aquilo que viemos fazer neste mundo.

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E veja que interessante: é esse terceiro estágio da felicidade individual, o do propósito, que nos permite começar a colocar em prática a nossa visão de como o mundo pode ser um lugar um pouco melhor. Para alguns, isso vem através de uma nova educação, uma nova forma de viver em cidades, de se alimentar, e assim por diante. E, quando conseguimos colocar nosso propósito em movimento, começamos a trabalhar pela dimensão coletiva da felicidade, que é criar uma sociedade com condições para que todos possam florescer.

Por isso, o propósito é o estágio mais elevado da felicidade humana. Faz sentido para você?

Se sim, te convidamos a conhecer a nossa pós-graduação em Cultura de Propósito e Negócios Regenerativos”.

Nesse curso estamos na zona proximal do futuro, considerando ações no presente que poderão encontrar ressonância no futuro e na sociedade.

Entendendo o princípio do pensamento de esquerda como um emanador de ações para o futuro, o propósito se coaduna com sua finalidade e projeta dimensões de cálculo e soluções coloniais, pois exige que o sujeito modifique sua atitude em benefício do outro e do mundo. E para isso deve aprender num curso de pós-graduação. O ensinar está na prática colonial como o vento está para a andorinha.

O propósito pode ser um enorme horizonte não para o futuro, como imaginam os professores do propósito, mas para o instante, para o presente da vida daquele que se investe do propósito, erigindo horizontes polimórficos que navegam em ondas de caos, imprevisíveis e estimulantes.

Num sentido de desmobilizar o império cognitivo, fornalha colonizadora, o propósito não precisa ser apreendido, pois nasce dentro de nós.

Leia aqui todos os textos de Eduardo Bonzatto

Se entendemos que o império cognitivo nutre a hierarquia e a desigualdade entre os seres, numa mônada elementar que nega a diferença colocando cada um na posição de desumanidade em relação ao outro, podemos também negar essa naturalização em busca da igualdade inalcançável por um sentimento que já carregamos em nossos genes humanos-terra, sem a soberania humana e no encontro com todos os outros seres vivos, independente de sua condição específica. E esse encontro não se coloca nem como superior ou inferior, mas está na mesma humanidade compartilhada, em que tudo que vive é teu próximo.

A propósito, esse sentimento já convive com as narrativas salvacionistas em prol de um mundo melhor, mas ao contrário dessas mesmas narrativas, o sentimento é uma presença, um instante sem supervisão, sem professor e sem boas intenções.
Se paramos para ouvir esse sentimento, ele está a nos dizer que nosso único propósito é servir o nosso próximo.

O fluxo desse sentimento existe para servir ao outro, seja esse outro quem for, sem nenhuma necessidade de melhorar o mundo ou de esperar reciprocidade. É um sentimento vocacional, que há milênios flui por nós, por cada um, que não foi eliminado ou expurgado com a colonização e nos liga a tudo que vive, a despeito das teorias que alimentam o futuro.

Esse é o propósito da vida, de uma vida boa, que é suficiente e necessário para tornar o nosso mundo melhor, ainda que apenas quem se vale do propósito sinta essa dimensão.

Antes da colonização, quando ainda vivíamos como humanos-terra, ou seja, como seres humanos-terra entre humanos-terra, antes que a modernidade nos individualizasse elevando nossa soberania acima da natureza pautados numa razão que só parecia razoável, mas que de fato era apenas o engodo em que os portões do inferno se alargavam sem limites e que agora, passados mais de quinhentos anos podemos sentir claramente como derrocada, pois nossa separação da natureza pautados na racionalidade é apenas um engano lamentável, insistimos em salvar o mundo de nós mesmos, da destruição que cada um de nós impõe com nossos hábitos e nossa razão e que aos pensadores de esquerda, os salvacionistas mais heroicos, cabe a tarefa de ensinar o caminho aos demais, cuja razão se resume aos hábitos inatos da colonização.

Ao propósito de servir o próximo nada falta, pois esse serviço depende exclusivamente daquele que sente e ao sentir emana duas condições fundamentais do servir. A primeira, emana alegria, que é o sentimento de que nada nos falta. A segunda emana felicidade, que é saber que com o servir, nunca estamos sós, mas estamos ligados infinitamente a todos os fluxos vitais em que as conexões estão vibrando num nível complexo muito abaixo das relações sociais geradas pelas teorias coloniais salvacionistas.

O propósito nos faz viver em plenitude, pois nasce dentro de nós e nos preenche completamente, devotando ao outro completo respeito pela sua forma, servindo de modo incondicional com nossa atenção, cuidado e reverência, seja ele um humano, um animal, um vegetal, um fungo.

Na zona isomórfica em que passamos a habitar, não existem seres desiguais, apenas diferenças que sem esforço aceitamos, sem julgamentos, sem resiliências, sem ofensas, sem teorias.

Com o abraço da complexidade, o propósito abrange o mundo todo com o fluxo do sentimento, sem ensinamento, sem sacrifício, sem futuro, exatamente agora, pois tudo que precisamos já está em nós, fluindo, espalhando energia por onde caminhamos, ao encontro de outras energias que estão também próximas de nós, aguardando nosso abraço.

*Eduardo Bonzatto é professor da Universidade Federal do Sul da Bahia (UFSB) escritor e compositor

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