Economia

Liberalismo econômico, inflação dos alimentos e a crença no Deus-Mercado

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Paulo Guedes e Jair Bolsonaro (Imagem: Marcos Corrêa | PR)

Max Marianek*, Pragmatismo Político

O Brasil sempre foi um grande exportador de itens agrícolas, desde a nossa formação mantivemos esta característica essencial de uma economia colonial e dependente, porém, além de grande exportador, pela atual linha econômica liberal dos últimos governos e em especial do governo Bolsonaro, estamos vendo uma alta generalizada dos preços dos alimentos e o aumento das importações de produtos agrícolas, inclusive de produtos que comercializamos no mercado internacional.

As importações de óleo de soja subiram 1.250% em comparação com novembro de 2019, as importações de arroz subiram três vezes em comparação com o mesmo período do ano passado e este ano o Brasil até outubro havia importado 625,5 mil toneladas de soja, em 2019 no mesmo mês havíamos importado 125 mil toneladas e produtos como a carne bovina e o milho também estão contribuindo para o aumento das importações.

Este desequilíbrio está relacionado ao preço do dólar, pois o valor elevado da moeda estadunidense incentiva a exportação pelos produtores brasileiros e não a sua venda no mercado interno, gerando desabastecimento, assim, para suprir o país é necessário o suporte dos produtos estrangeiros que são comprados em dólar,

Portanto, temos falta de oferta de alimentos produzidos internamente, pois estão sendo exportados o que aumenta os preços no país e por outro lado para tentar amenizar a escassez desses produtos importamos mercadorias em uma cotação desfavorável, criando uma bomba que explode nos preços dos alimentos, gerando uma alta inflação que penaliza de forma mais profunda as famílias trabalhadoras e de setores marginalizados.

O aumento da importação de produtos que tradicionalmente somos exportadores, a escassez no mercado interno, somada a alta do dólar, demonstram um sério desajuste econômico. Entretanto, este problema também se relaciona com a hegemonia da matriz liberal dentro do pensamento econômico brasileiro nos últimos anos, expressa claramente nas ideias de Paulo Guedes.

Para os liberais qualquer intervenção estatal ou planejamento é sinônimo de ineficiência, um pressuposto claramente ideológico mas aceito como postulado técnico e neutro. Porém, o quadro atual da economia brasileira mostra o inverso, a total desregulação ou falta de planejamento do estado criou um quadro de graves desequilíbrios econômicos, que fragilizam a economia do país, inclusive sua soberania alimentar, jogando na fome milhões de brasileiros.

Instrumentos como a formação de estoques regulatórios de grãos, uma ferramenta para proteger os pequenos e médios produtores quando os preços não cobrem os custos de produção e para proteger o preço dos alimentos de flutuações ou de um aumento generalizado devido a problemas relacionadas a questões climáticas que alteram as safras ou devido ao câmbio, foram descartados pois representam uma intervenção do estado. Neste momento os armazéns públicos estão sendo precarizados para facilitar um futuro processo de privatização.

Diferente de outros países produtores que neste momento reforçaram seus estoques para não sofrerem pressões inflacionárias o Brasil seguiu o caminho oposto dando total liberdade aos produtores para exportarem tudo que desejassem, afetando a oferta dos produtos no interior do país, gerando esse cenário catastrófico, agravado pelo preço do dólar que encarece as importações.

A falta de um mínimo de planejamento econômico, de pensamento estratégico, devido a crença dos liberais na alocação perfeita realizada pelo mercado, está jogando a economia brasileira nas cordas, atingindo as famílias trabalhadoras que tem de arcar com os altos preços dos alimentos, levando muitas a passarem fome.

O que garantiu um mínimo de estabilidade para diversas famílias foi o auxílio-emergencial, que injetou bilhões na economia, dando acesso à alimentação, porém com o corte no auxílio e logo mais sua extinção, milhões de famílias estarão em frente a um mercado inflacionado, mas sem recursos para conseguir se alimentar. Já são 10,3 milhões de brasileiros que passam fome, conforme dados do IBGE de 17 de setembro de 2020.

Era também claro que haveria pressão inflacionária devido ao aumento da demanda graças ao auxílio-emergencial de 600 reais, que permitiu um consumo um pouco mais ampliado para milhões de brasileiro, porém, mesmo assim o governo foi surpreendido e não planejou nada para amenizar esse aumento dos preços, acreditando na perfeição do mercado. A única reação do governo e de Paulo Guedes foi culpar os trabalhadores e os pobres por comerem mais, um cinismo surpreendente.

Agora devido a todos esses fatores tivemos a maior inflação sobre os alimentos desde 2002, de acordo com IPCA-15 os alimentos encerraram 2020 com alta acumulada de 14,36%, o que qualquer pessoa percebe facilmente indo ao mercado.

Em síntese e de forma simplificada podemos afirmar: o estado brasileiro atualmente permite que os produtores exportem tudo, sem qualquer estratégia, gerando escassez no mercado brasileiro, o que eleva a inflação (agravado pelo dólar alto) e dificulta a alimentação das famílias trabalhadoras e joga os brasileiros na fome, tudo isso graças a declaração de fé na perfeição do deus-mercado.

A irracionalidade evidente do liberalismo neste caso é o problema central que deve ser combatido, devemos criar instrumentos que permitam a formulação de planejamento econômico, de compreensão estratégica das necessidades brasileiras e ferramentas que auxiliem o estado na condução de um projeto de desenvolvimento nacional guiado pelos interesses da classe trabalhadora brasileira.

*Max Marianek é graduado em História pela CUFSA e graduando em Biblioteconomia pela USP.

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