Saúde

Médico que operou ‘Mc Atrevida’ diz que “ela morreu porque tinha que morrer”

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Responsável por fazer procedimento estético na cantora MC Atrevida, médico diz em depoimento que sua paciente “morreu porque tinha que morrer, visto que são circunstâncias da vida”. Amiga revela as últimas palavras da funkeira e especialistas lançam alerta sobre cuidados imprescindíveis

MC Atrevida (esq.) com Janine Vieira

Wilson Ernesto Garlaza Jara, responsável por fazer um procedimento estético em Fernanda Rodrigues, conhecida como ‘MC Atrevida’, prestou depoimento na última segunda-feira (3/8) no Rio de Janeiro. O médico equatoriano chegou no local em uma cadeira de rodas, pois sofreu um AVC recentemente.

Em depoimento, Wilson disse que já realizou mais de 4,6 mil procedimentos do tipo e que MC Atrevida “morreu porque tinha que morrer, visto que são circunstâncias da vida”. De acordo com o delegado à frente do caso, André Neves, a investigação pode identificar crimes além do erro médico, como a imputação de um fato delituoso.

“Estamos aguardando resposta oficial do Conselho Regional de Medicina e vamos colher outros depoimentos. Se ficar constatado que ele não tinha expertise para realizar um procedimento cirúrgico, a investigação pode ir por essa linha de não só um erro médico, como a imputação de um fato delituoso”, pontuou.

O médico responsável pelo procedimento, no passado, já havia sido condenado pela Justiça por erro médico. A condenação ocorreu em 2014 e ele teve de pagar R$ 6 mil a uma paciente por um laudo incorreto.

Segundo a defesa, o médico sofreu os derrames após a cirurgia de Fernanda Rodrigues e, por isso, o depoimento foi adiado. “Eu comuniquei à polícia que ele não se encontra em condições psicológicas, não está lúcido, porque sofreu dois AVCs três dias depois do procedimento. Mas o trouxemos para mostrar nossa boa vontade”, disse o advogado Carlos Costa.

MC Atrevida, de 43 anos, morreu no dia 27 de junho após realizar hidrolipoaspiração na clínica Rainha das Plásticas. O estabelecimento está interditado desde o dia 31 de julho pela prefeitura do Rio e a Vigilância Sanitária.

Últimas palavras

Amigas há mais de 20 anos, Fernanda Rodrigues e a DJ Janine Vieira eram inseparáveis. Ambas chegaram a tralhar juntas no funk até 2010. Até mesmo no dia do procedimento estético de Fernanda Janine foi junto.

A DJ afirmou que a amiga, após o procedimento, estava muito dopada, não aguentava andar e precisou ser carregada até o carro e voltar para casa. Janine relata quais foram as últimas palavras que ela ouviu de Fernanda:

“Amiga, como eu sofri. Você não escutou os meus gritos? Lá atrás eu gritava muito e falava (para o médico) que estava doendo e eu estava sentindo o equipamento dentro de mim. Depois eu apaguei e não vi mais nada”.

Segundo Janine, Fernanda havia conhecido a empresária Wânia Tavares, que se intitula ‘Rainha das Plásticas’, pelo WhatsApp e ambas fizeram uma parceria profissional. A artista pagaria menos da metade de todo o procedimento estético que fizesse, em contrapartida ajudaria a divulgar Wânia, que queria disputar uma vaga na Câmara dos Vereadores do Rio.

“Ela fez hidrolipoescultura com enxerto no bumbum com gordura e pagou R$ 3 mil. Foi R$ 1 mil antecipado e o restante no dia do procedimento. O pagamento foi feito antes da hidrolipo”, contou Janine, que disse ter se surpreendido com a idade do médico antes da cirurgia.

“Quando chegamos lá eu disse pra ela: ‘amiga, esse médico é realmente, bom?’ Ele não falava coisa com coisa e eu achei ele muito velhinho. Para certificar, eu ainda perguntei para uma funcionária da clínica se ele era confiável e experiente. A resposta foi sim e a justificativa era que ele havia trabalhado na equipe do doutor Pitanguy (cirurgião plástico Ivo Pitanguy, falecido em 2016). Então, para mim, era uma coisa certa”.

Segundo a amiga, o médico Wilson Ernest Garlaz Jara teria aplicado duas anestesias na funkeira. Uma local, e vendo que o medicamento não havia surtido efeito, ele aplicou uma segunda anestesia, a geral. Muito abalada, Janine diz que quer justiça pela morte da amiga.

Cuidados

A lipoescultura, também chamada de hidrolipo, é uma variante do aperfeiçoamento da lipoaspiração. Em síntese, o processo consiste em retirada de gordura de um determinado sítio corporal, e a injeção (enxerto) desta gordura em outra área do corpo. O presidente da SBCP, o cirurgião plástico Dênis Calazans, explica quais são os procedimentos imprescindíveis antes de realizar este tipo de operação.

“É necessário uma avaliação pré-anestésica, realizar exames sanguíneos (hemograma, coagulograma, glicemia, sódio, potássio, ureia, creatinina), fazer uma avaliação cardiológica e uma ultrassonografia do abdômen (para os casos de lipoaspiração no abdômen). O pós-operatório também pede uma grande coparticipação do próprio paciente em seguir criteriosamente as recomendações médicas, que são próprias de cada profissional e técnica realizada”, afirma Calazans.

Os riscos estão presentes em qualquer procedimento cirúrgico. No entanto, quando se fala em plástica a atenção aumenta. Nas redes sociais, há muitas ofertas de procedimentos mais baratos ou com pacotes de vantagens, o que muitas vezes pode se tornar uma grande dor de cabeça.

O laudo da morte de MC Atrevida aponta que ela teve septicemia subcutânea, que culminou em uma infecção generalizada causada por inflamação na pele. Para o cirurgião plástico carioca Renato Cazaes, o paciente precisa avaliar quanto vale a sua vida antes de marcar a cirurgia.

“Quando uma plástica dá errado, o dano é permanente, independente se for menor ou maior. Durante a cirurgia, você está entregando o seu maior patrimônio, que é a a tua vida nas mãos do médico. Às vezes, gastar um pouco mais pode evitar. Ela deve ter pagado o valor mediano, entre R$ 2 mil e R$ 3 mil. Eu cobro, no mínimo R$ 5 mil ou 6 mil. Mas quando for muito barato, tem que desconfiar”, observa Renato.

A lipoescultura sempre vem acompanhada de dor, segundo Renato Cazaes, mas que permanece intensa entre três e cinco dias em 70% dos pacientes. Após esse período, entre cinco e oito dias depois da cirurgia, é realizada uma consulta de retorno para ver como está a situação do procedimento e da pessoa. MC Atrevida não teve essa consulta de retorno e só ouviu da dona da clínica que era “normal sentir tanta dor”. Conforme o médico, “uma dor por tanto tempo e estranha precisa ser avaliada”.

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