Racismo não

7 dos 20 livros mais vendidos do Brasil são de pessoas negras

Share

Levantamento que reúne dados de uma centena de livrarias físicas e online no Brasil mostra o avanço de autores e autoras negras, em especial na categoria de Não-Ficção

(Imagem: reprodução)

Denis Pires, Casa Um

O levantamento feito pela Revista Veja dos livros mais vendidos no país é considerado um dos mais confiáveis e completos.

Publicada quinzenalmente, a lista reúne dados de uma centena de livrarias físicas e online e tem mostrado a cada edição, o avanço de autores e autoras negras, em especial na categoria de Não-Ficção.

O atual período levantado que muda no próximo dia 15 de julho, os títulos “Pequeno Manual Antirracista”, “Quem tem Medo do Feminismo Negro” (ambos Companhia das Letras) e “Lugar de Fala” (Pólen Livros), de Djamila Ribeiro ,“Racismo Estrutural”(Pólen Livros), de Sílvio Ameida, “Minha História”, (Objetiva) de Michelle Obama, “Mulheres, Raça e Classe” (Boitempo), de Angela Davis e “Eu sei Porque o Pássaro Canta na Gaiola” (Astral Cultural), de Maya Angelou, ocupam respectivamente o 1º, 15º, 17º, 4º, 7º, 14º e 19º lugar na lista.

Para celebrar esse avanço, preparamos aqui uma mini biografia de cada uma das autoras e do autor que compõe o levantamento:

Djamila Ribeiro (Santos, SP, 1980)

Com os três livros que escreveu na lista dos mais vendidos, sendo “Pequeno Manual Antirracista” em primeiro lugar, a filósofa, escritora, ativista e conferencista Djamila Ribeiro dá voz à temas urgentes e necessários sobre o movimento negro (em particular o genocídio da população negra), o feminismo e os estudos de gêneros e propõe discussões sobre as formas de combate ao racismo estrutural presente na sociedade.

De intensa produção, Djamila teve contato com a militância e o ativismo negro desde a infância através de seu pai, militante e fundador do Partido Comunista de Santos, estudou Filosofia na UNIFESP e possui mestrado em Filosofia Política pela mesma instituição. Sua dissertação relacionava o pensamento de Beauvoir e Butler com autoras negras como Audre Lorde e Sueli Carneiro. A aproximação da filósofa com a literatura negra, eventos e campanhas deu-se na Casa de Cultura da Mulher Negra, local em que ela trabalhou após a morte dos pais.

A autora foi secretária adjunta de Direitos Humanos da Cidade de São Paulo na gestão de Fernando Haddad, em 2016 e teve seu trabalho premiado com o Prêmio Trip Transformadores e Cidadão São Paulo em Direitos Humanos e o Dandara dos Palmares, de Santos, SP e o Prince Claus Awards, entregue na Holanda.

Países como Noruega, Alemanha, África do Sul e França estão entre os que Djamila já apresentou seu trabalho. Hoje escreve para o jornal Folha de São Paulo e para a revista Elle. Suas colunas para a revista CartaCapital deram origem ao livro “Quem tem Medo do Feminismo Negro?”, 15º lugar entre os mais vendidos. É coordenadora da importante coleção Feminismos Plurais.

Para Djamila, a questão racial é para todos e todas. “Minha luta diária é para ser reconhecida como sujeito, impor minha existência numa sociedade que insiste em negá-la”.

Sílvio Almeida, (São Paulo, SP, 1977)

Com uma prolífica vida acadêmica, Sílvio Almeida fez a maior parte de seus estudos na USP formando-se advogado, filósofo, doutor e pós doutor. Também é professor das universidades paulistas Mackenzie e FGV, professor visitante na Universidade Duke, Carolina do Norte, EUA e preside o Instituto Luiz Gama, associação de juristas, militantes e acadêmicos que atuam nas questões dos negros, minorias e direitos humanos.

Seu livro “Racismo Estrutural”, da coleção Feminismos Plurais, figura na lista em 4º lugar como um dos mais vendidos no país e possui importantes ferramentas para a compreensão do racismo.

Para o advogado, o combate ao racismo envolve muitos outros assuntos como a economia (fundamental para seu entendimento), a política e a educação e depende da orientação ideológica e política da sociedade. Também afirma ser indispensável a desnaturalização do racismo e a transformação do discurso em ação e prática.

Em sua fala, Sílvio Almeida cita vários autores e livros, como o filósofo camaronês Achille Mbembe, com “Necropolítica”, conceito muito bem explicado e trabalhado por ele na famosa entrevista ao programa da TV Cultura Roda Viva, de 22/06/20, já abordada pelo Blog da Casa aqui.

Cornel West, escritor, professor e ativista estadunidense também é frequentemente mencionado por Almeida, destacando o conceito da “tempestade perfeita”, para falar sobre os protestos antirracistas, a pandemia do coronavírus e a angústia provocada pela ideia da morte como único significado da vida lembrando que “precisamos dar espaço para as pessoas sonharem. Se não tiver esse espaço, a vida vira pura miséria”.

Michelle Obama, (Chicago, EUA, 1964)

“Minha História”, de Michelle Obama, está em 7º lugar na lista e é considerado a autobiografia de maior sucesso comercial da história, com mais de 10 milhões de cópias vendidas pelo mundo.

As memórias da ex primeira dama dos Estados Unidos é um relato intimista sobre a infância em Chicago até o governo de Barack Obama, em Washington. Entre várias recordações e reflexões, Michelle fala sobre família, educação, o racismo e as dificuldades que enfrentou, sua relação com o marido e as filhas, Malia e Natasha, sobre política, seu trabalho na advocacia e as causas sociais que se envolveu. Como fundadora da ONG Public Allies, Michelle recorda como sendo “um dos momentos mais gratificantes da minha vida profissional”.

Desde pequena, Michelle foi uma estudante muito dedicada e se formou em Princeton e Harvard. No escritório de advocacia em que se conheceram, Michelle era mentora de Barack Obama e ele advogado associado. No livro, a autora conta como foi o desafio de conciliar seu trabalho e a criação das filhas com a participação nas campanhas do marido.

Fã de Michelle Obama, a jornalista e apresentadora Maju Coutinho foi a escolhida para narrar a autobiografia em audiolivro. Paralelos com o Brasil e identificações foram inevitáveis e Maju não escondeu a emoção: “Tem muitas passagens emocionantes e significativas. Tinham momentos em que eu chorava mesmo, porque a história dela é muito emocionante. Ela conta coisas que eu vejo no Brasil; sonhos interrompidos de mulheres e homens por conta da barreira social”, disse em entrevista ao jornal Folha de São Paulo.

Angela Davis, EUA, 1944

Em 14º lugar na lista com o livro “Mulheres, Raça e Classe”, a ativista, escritora, professora e filósofa estadunidense Angela Davis é um ícone da luta pelos direitos civis da população negra e das mulheres.

Natural do Alabama, estado historicamente racista do sul dos Estados Unidos, Angela se aproximou do pensamento socialista e comunista quando jovem e teve professores ligados à Escola de Frankfurt, como Hebert Marcuse e Theodor Adorno. Começou a militância na década de 1960, era próxima do grupo Panteras Negras e desde então traçou uma trajetória singular na liderança do ativismo político e social celebrada no mundo inteiro.

Neste livro, Davis discute sobre a interseccionalidade entre mulheres, classe e raça e a impossibilidade da formação de uma nação que não questione a centralidade e urgência da questão racial, uma vez que esta mesma sociedade foi fundada no racismo.

A autora propõe uma reflexão -e uma denúncia- sobre o controle social que faz o aprisionamento da população negra (e a construção do negro como perigoso e violento) em massa resultando em um controle social que nos remete à necropolítica de Achille Mbembe.

Entre outros assuntos, Davis aborda a importância da representatividade, faz uma crítica à esquerda e reflete sobre as inúmeras opressões sofridas pelas pessoas.

Hoje professora emérita na Universidade da Califórnia, Angela dedica seu tempo à conferências, palestras e à escrita. Em uma de suas passagens pelo Brasil, Angela discorreu sobre seu trabalho, relembrou a vereadora Marielle Franco, brutalmente assassinada em 2018, e proferiu: “Muitas das minhas camaradas tombaram durante a luta. Acredito que seja minha responsabilidade testemunhar em homenagem aos que não estão mais entre nós. E afirmar que se permanecemos na luta, eventualmente, alcançaremos a vitória”.

Maya Angelou, EUA, 1928-2014

A escritora e poeta Maya Angelou está em 19º lugar com “Eu Sei Porque o Pássaro Canta na Gaiola”, o primeiro livro dos cinco volumes da sua autobiografia, escrito em 1969 e indicado ao prêmio Pulitzer.

Pseudônimo de Marguerite Ann Johnson, Maya revive suas memórias desde a infância muito pobre com seu irmão e avó, até a adolescência, passando por várias situações traumatizantes como a separação dos pais, o abandono, o assédio sexual sofrido por parte do namorado de sua mãe quando ainda era uma criança e como foi viver e crescer em uma época de grande segregação racial.

A autora nos conta como a relação com a literatura desde jovem a ajudou a se adequar ao mundo e à compreensão de si mesma.

Maya Angelou participou constantemente da luta a favor dos direitos civis, foi amiga de Martin Luther King e Malcolm X e passou um período no continente africano ajudando movimentos de independência. A escritora teve uma vida repleta de momentos impressionantes e tem uma maneira muito particular de falar do individual para o coletivo.

Um dos seus mais belos e famosos poemas, “Ainda Assim Eu me Levanto”, mostra toda a sua força e clareza de ideias. Angelou ganhou o Grammy por Melhor Texto Recitado com o poema “On the Pulse of Morning”. Também foi roteirista, diretora e atriz, atuando na ópera “Porgy e Bess”, de Cole Porter e trabalhou com o diretor francês, Jean Genet.

Ela produziu até o último ano de vida, lançando livros antes de falecer. Em seu funeral personalidades políticas, artísticas e ativistas como Oprah Winfrey e Michelle Obama discursaram e celebraram a vida de uma das maiores escritoras estadunidenses.

Siga-nos no InstagramTwitter | Facebook