Redação Pragmatismo
Saúde 19/Abr/2019 às 11:24 COMENTÁRIOS
Saúde

Jovem de 23 anos comete suicídio após circuncisão

Publicado em 19 Abr, 2019 às 11h24

Mãe decidiu compartilhar caso do filho porque este foi o último desejo exposto por ele na carta detalhada que escreveu antes de morrer. Médicos falam sobre os prós e contras da circuncisão

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Alex Hardy e Lesley Roberts (reprodução)

Um jovem de 23 anos cometeu suicídio após realizar uma circuncisão que o deixou com traumas e dores insuportáveis. Ele descreveu o caso em uma carta comovente cheia de detalhes.

Alex Hardy nasceu no condado de Cheshire, na Inglaterra. O jovem programou um e-mail para ser enviado a sua mãe 12 horas depois de ele se matar. Na mensagem, estava a íntegra da carta.

“Saiba que eu fui em paz e agora estou em paz, o que era impossível depois desta mutilação. Eu morri em 2015, não foi agora”, diz trecho da carta de Alex. As informações são da BBC Reports.

Alex explica na carta como a cirurgia em seu prepúcio peniano, dois anos antes, arruinou a sua vida. O procedimento foi realizado em 2015 e o jovem se matou em 2017.

O estudante descreveu a operação de circuncisão como uma “mutilação genital masculina”. Na carta, ele diz querer alertar outras pessoas para que evitem esse caminho doloroso.

“Onde antes havia um órgão sexual, agora há um pênis adormecido, malfeito e fracassado. Minha sexualidade foi deixada em frangalhos”, lamentou o rapaz.

Canadá

Alex gostava de esquiar e, após uma viagem para o Canadá para praticar o esporte, o jovem decidiu mudar-se definitivamente para o país aos 18 anos.

Ele abandonou a universidade que cursava no Reino Unido e atravessou o atlântico. No Canadá o jovem obteve residência e viveu os últimos 5 anos de sua breve vida.

Alex fez muitas amizades e era muito bem quisto pelos colegas de trabalho. No entanto, enquanto prosperava profissionalmente, ele estava lutando silenciosamente com uma condição que o atormentava desde a adolescência.

Agonia sem fim

Alex tinha fimose, que é a dificuldade ou impossibilidade de retrair o prepúcio, impedindo a exposição da glande (cabeça do pênis). A fimose nem sempre causa problemas, mas pode provocar dificuldade para urinar e dor durante o ato sexual.

Em 2015, ele foi a um urologista que “sugeriu imediatamente a circuncisão”. No Reino Unido, o sistema público de saúde recomenda a aplicação de esteroides tópicos e técnicas de alongamento para a fimose. A circuncisão é o “último recurso”.

Com 21 anos na época, Alex foi convencido pelo médico e decidiu realizar o procedimento cirúrgico, mas o jovem sofreu constantes problemas físicos dolorosos depois, com a cabeça do pênis experimentando estimulação constante.

“Essas sensações sempre presentes estimuladas pela fricção de roupas são uma tortura por si só; elas não diminuíram/normalizaram após anos de exposição da glande. Imagine o que aconteceria com o globo ocular se a pálpebra fosse amputada?”, escreveu.

As dores intermináveis impediram Alex de conseguir realizar atividades físicas normalmente. No e-mail, ele destacou: “A natureza é mais sábia. Como cortar parte de um tecido saudável pode melhorar o design que a natureza desenvolveu?”

Alex procurou ajuda médica e psicológica após a operação — mas, infelizmente, não foi suficiente para acabar com sua dor e ele tirou a própria vida em 25 de novembro de 2017.

Mãe de Alex

“Ele sentia muita dor porque as atividades físicas normais machucavam”, diz Lesley Roberts, mãe de Alex. “Ele era um grande esquiador e snowboarder, então você pode imaginar a dor que ele estava sentindo.”

Lesley Roberts é professora e passou a fazer palestras em escolas para conversar com os jovens e convencê-los da importância de compartilhar seus problemas pessoais.

“Eu acho que todos nós sabemos que os homens tendem a não falar sobre os seus problemas da mesma forma que as mulheres. A circuncisão ainda é um tema muito tabu. Alex foi reservado. Ele não sentiu-se confortável para falar sobre o seu prepúcio. Ele nunca falou e eu não sabia”, disse Lesley.

A organização britânica 15 Square, que tenta educar as pessoas sobre a circuncisão, destaca que Alex não é o primeiro homem a cometer suicídio após ser circuncidado. “Isso acontece com mais frequência do que as pessoas pensam”, diz David Smith, presidente da instituição.

Não há, no entanto, estatísticas disponíveis sobre pacientes que se mataram após o procedimento. Alex, por exemplo, morreu há mais de um ano, mas sua história não havia sido contada até agora.

Trechos da carta

“Diante da ausência (do freio), posso atestar claramente que é a área mais sensível do pênis e do corpo masculino em geral. Se alguém amputar o seu clitóris, pode ser que você consiga entender como me sinto.”

Em outro trecho da carta, Alex relatou sentir câimbras e contrações musculares, além de sensações “desconfortáveis” que se estendiam até seu abdômen.

“Se eu fosse uma mulher nas nações ocidentais isso seria ilegal, o cirurgião seria um criminoso e isso nunca teria sido considerado uma opção pelos médicos”

“Se as informações a seguir puderem beneficiar alguém, isso serviu para um propósito. Não me senti à vontade para levantar a questão quando tive oportunidade, então, se a minha história puder aumentar a conscientização e quebrar esse tabu dentro da sociedade em relação à saúde dos homens, fico feliz em divulgar minhas palavras.”

Circuncisão: prós e contras

Membro da Associação Britânica de Cirurgiões Especializados em Urologia, o cirurgião Trevor Dorkin explica que a cabeça do pênis costuma ficar mais sensível após a circuncisão, mas essa sensibilidade tende a diminuir com o passar do tempo.

“Eu sempre digo para os rapazes que ‘vai ficar mais sensível no começo’, porque de repente você não tem mais essa proteção sobre a cabeça do pênis e a sensação vai ser diferente”, afirma Dokin. Ele já realizou mais de mil circuncisões.

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), 95% dos homens são circuncidados na Nigéria, mas apenas 8,5% se submeteram ao procedimento no Reino Unido. No Canadá, estima-se que 32% dos homens sejam circuncidados.

As experiências de pacientes circuncidados na vida adulta diferem dramaticamente. Alguns acham o sexo melhor, uma vez que não sentem mais a dor do prepúcio apertado ou inflamado. Já outros relatam uma perda significativa de sensibilidade e redução do prazer sexual.

Dorkin esclarece que a ocorrência de problemas sérios após a circuncisão é rara, mas não impossível. “Você ouve histórias de horror em que a circuncisão foi mal feita e há danos causados à própria cabeça do pênis. Os cirurgiões, no fim das contas, são humanos e há potencial para erro humano e técnico durante qualquer cirurgia”, afirma.

O médico urologista André Cavalcanti destaca que, quando a cirurgia é realizada dentro de uma indicação médica precisa, com uma completa discussão com o paciente sobre resultados e possíveis complicações, “a circuncisão é um excelente procedimento”.

“A circuncisão oferece um papel protetor sobre o câncer de pênis, doença prevalente em populações com baixa condição sócio-econômica e com baixos níveis de higiene. A adequada higiene corporal e limpeza peniana com água e sabão também oferecem um papel de proteção para este tipo de câncer, sem a necessidade de realização de cirurgia”, observa André.

“Muitos homens apresentam uma exposição completa da glande, que pode estar parcialmente ou totalmente recoberta pelo prepúcio, sem qualquer tipo de queixa e neste caso não há indicação de qualquer tipo de procedimento cirúrgico do ponto de vista médico”, acrescenta o médico.

Repercussão

Divulgado pelo serviço mundial da BBC, o caso de Alex Hardy ganhou repercussão internacional e foi traduzido em diversos idiomas. No Brasil, alguns portais republicaram o conteúdo e internautas que se identificaram como médicos esbravejaram. Houve polêmica.

“Sou médico urologista e afirmo: essa reportagem é um desserviço à sociedade. A circuncisão é um procedimento seguro e muito importante […]. Jornalismo baixo, raso, que evidentemente demonizou médicos sem qualquer pudor ou evidências para tal. Nada diferente do alinhamento ideológico deste canal em particular […] em concordância com seus valores […] que por sinal são os mesmos dos governos passados que elegeram a classe médica com a responsável por todas as mazelas do ineficaz sistema de saúde nacional”, criticou um usuário.

“Para quem sabe ler, independente da formação acadêmica, vê-se tratar de uma matéria internacional (BBC News). Ou seja, já rodou o mundo todo. O foco não é desmoralizar médico algum, mas sim alertar sobre possíveis consequências da citada cirurgia quando não bem executada. Ficar com indiretas contra a mídia, escondendo ódio, de nada vale, pois, independente do viés ideológico de qualquer reportagem, é mais que sabido pela população em geral que, salvo raríssimas exceções, a “nobre” classe médica brasileira, oriunda quase que 100% de nossa igualmente “nobre” elite brasileira, não está nem aí para a saúde pública, caso contrário nem de programa “mais médicos” precisaríamos. A maioria, que se forma em universidades públicas, nem se dignam a prestar plantão de forma decente em centros médicos de periferias das grandes cidades, quiçá nos rincões do brasil. Logo, sua gritaria é sem fundamento”, rebateu outro internauta.

Alex Hardy (reprodução)

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