Redação Pragmatismo
Racismo não 11/Nov/2014 às 13:26 COMENTÁRIOS
Racismo não

O dia a dia das jovens negras nos shoppings do Brasil (e o racismo incessante)

Publicado em 11 Nov, 2014 às 13h26

“Senti hoje o verdadeiro peso do racismo, aquele que transforma negra de cabelo crespo em ladra”. Jovem universitária conta como foi do céu ao inferno em um dia que havia “começado muito bem, mas acabou dentro de uma delegacia”

ana paula bispo racismo salvador
Ana Paula Bispo prestou queixa na delegacia após constrangimento racista e encoraja vítimas a tomarem mesma atitude (Reprodução/Facebook)

Aconteceu no último sábado (8) na loja Riachuelo, no Shopping Iguatemi em Salvador. Uma jovem negra sofreu constrangimentos racistas enquanto fazia compras. A jovem prestou queixa na delegacia e escreveu um relato no Facebook – testemunho que revela como as mulheres negras, com seus cabelos encrespados, ainda sofrem constrangimentos cotidianos neste país miscigenado mas erroneamente apelidado por desatentos ou mal intencionados de “democracia racial”.

por Ana Paula Bispo

Aconteceu comigo, aconteceu hoje.

Comecei meu dia muito bem, fui pra uma aula maravilhosa, nem imaginaria que poucas horas depois estaria na delegacia prestando queixa. Acho importante que o máximo de pessoas saibam o ocorrido, pois não acredito que seja um fato isolado.

Passei no shopping Iguatemi depois da aula pra resolver umas coisas, entre elas efetuar um pagamento na loja Riachuelo, entrei na loja pelo terceiro piso e umas bijuterias em promoção chamaram minha atenção. Parei para olhar e vi um brinco no formato de filtro dos sonhos, mas para mim … estava meio caro e segui. Parei novamente [próximo] aos caixas para ver o preço de um copo, quando um funcionário tocou em mim. A princípio imaginei que queria passagem, quando ele me perguntou se eu estava assustada. Antes que eu respondesse qualquer coisa, pois estava atônita, ele foi ordenando que retirasse o brinco da bolsa. Que brinco, meu Deus!!!

VEJA TAMBÉM: Para provar que não roubou, homem tira a roupa em shopping de Salvador

Indignada e confusa comecei a retirar tudo que havia na minha bolsa ali mesmo. Como a referida aula era de filmagem, estava com o equipamento dentro de uma bolsa menor, [e] ele apontou pra esta bolsa. Pedi que ele olhasse o conteúdo da bolsa, pois não gostaria de expor o mesmo, ele pediu que uma outra funcionária que havia se aproximado para olhar o interior da bolsa onde o equipamento fotográfico estava devidamente guardado. Esta funcionária era justamente a pessoa que ‘me viu’ colocar o brinco dentro da bolsa e já chegou perto de mim com uma cestinha para que eu colocasse o tal brinco.

Várias pessoas me olhavam, pedi que se identificasse e disse que não sairia da loja sem as informações necessárias para prestar a queixa.

Falei com supervisora, que se desculpou e disse que esse não era o procedimento adotado pela loja, me explicou como seria, tentou me enrolar, disse que a tal funcionária que me acusou era temporária e estava no primeiro dia (E eu com isso?).

Exigi ver ela registrar a ocorrência, peguei o primeiro nome e função dos três, registrei o ocorrido com a administração do Shopping e segui para a 16ª. Relatei a ocorrência e vou levar a diante. Provavelmente será apenas mais um processo contra a loja, mas é questão de honra levar até a última instância. Como disse no princípio isso não é uma situação isolada, senti hoje o verdadeiro peso do racismo, aquele que transforma negra de cabelo crespo em ladra. Podem dizer que não há relação, mas enquanto eu não vir moças brancas com seus cabelos lisos relatarem fatos iguais não me convencerei.

VEJA TAMBÉM: Por que é racismo chamar um negro de ‘macaco’?

Acompanhe Pragmatismo Político no Twitter e no Facebook.

Recomendações

COMENTÁRIOS