Luis Soares
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Saúde 02/Jul/2012 às 23:25 COMENTÁRIOS
Saúde

Filha fingiu estar armada para pai ser atendido em hospital

Luis Soares Luis Soares
Publicado em 02 Jul, 2012 às 23h25

A pedagoga Mary Stela Camillato, 46, fingiu ter uma arma e fez uma gerente de plano de saúde refém em Vitória (ES), na terça, para conseguir atendimento para seu pai, que tem câncer no cérebro.

mary stela armada pai

Mary Stela, 46, que foi levada à delegacia depois de ameaçar funcionária de plano de saúde

O hospital informou que não faria sua sessão de quimioterapia porque o convênio não tinha pago o tratamento.

Leia abaixo seu depoimento.

Tomei uma atitude errada, mas vinha tomando a certa desde dezembro.

Tenho uma liminar para garantir o tratamento do meu pai, mas o plano não acata a decisão do juiz. O que aconteceu na terça foi o meu limite.

Acabamos ficando inadimplentes com o plano porque tudo o que a gente precisava tinha que pagar particular. Médicos e clínicas foram descredenciados e, como estávamos insatisfeitos, nossa intenção era trocar o convênio.

Mas, quando meu pai foi examinado para entrar em outro plano, descobriu um problema no coração. Desistimos da troca. Como tinha a carência do convênio, ele foi tratado no SUS e na rede particular. Descobrimos, então, um aneurisma.

Resolvemos pagar o plano em agosto. Pagamos atrasado, mas pagamos R$ 429,90 por mês há oito meses.

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Em dezembro, após uma tomografia do crânio, descobrimos o câncer.

No único hospital que o plano tem para internar não tinha a especialidade que meu pai precisava, oncologia. Ele entrou em coma e foi para um terceiro hospital porque o juiz mandou.

Lá, o plano negociou pagamento particular. O hospital deu alta para ele porque a dívida estava grande. Meu pai ficou 15 dias sem tratamento, e o juiz determinou de novo que ele fosse atendido.

Ele faz químio toda terça. No dia 25, o hospital telefonou pedindo para não levar meu pai porque o plano estava pendente com valores.

Mas eu fui para o hospital, onde me falaram que não fariam procedimento. Fui à sede do plano em Vitória, questionei a gerente e ela falou que não tinha dinheiro.

A gerente-geral sugeriu que eu conversasse com o diretor do hospital: “Quem sabe ele não atende de novo sem cobrar”? Eu achei o cúmulo, uma falta de respeito, e tomei aquela atitude.

Fechei a porta e falei: “Estou com arma na bolsa, você vai ligar para a gerente-geral e dizer que só vou te liberar quando liberarem o tratamento”.

A polícia foi até lá e ficou tentando negociar, pedindo para eu liberar a refém. Eu dizia que a Justiça não estava resolvendo. Depois de 40 minutos, conseguiram negociar com o hospital.

Na delegacia, assinei um termo circunstanciado por ameaça e fui liberada.

Eu não tinha arquitetado o plano antes. Nem sei o que faria se a gerente não acreditasse que eu estava armada.
Tinha mais de 50 idosos esperando no escritório. Aquilo me revoltou muito porque vi que todos estavam com o mesmo problema do meu pai.

Ele não sabe que eu fiz isso, nem que tem câncer. Pode entrar em depressão e ter algum problema. Desligamos todas as TVs para ele não saber o que aconteceu. Ele não precisa passar por essa humilhação.

O plano alega que a gente não aceita a doença. Eu digo que sei que é grave. Mas quero que ele morra fazendo o tratamento com dignidade.

OUTRO LADO

O plano Saúde Internacional nega que tenha atrasado o pagamento ao hospital e diz que o tratamento de Ronaldo Camillato já estava liberado mesmo antes de Mary Stela fazer a funcionária refém.

Segundo o advogado do plano, Fernando Bianchi, havia apenas um problema administrativo, pois o plano precisava de uma avaliação do tratamento para fazer sua previsão orçamentária para o mês de julho.

Já o hospital Evangélico de Vila Velha disse por meio da assessoria que o plano está inadimplente e que a sessão de químio só foi feita, na terça, porque o convênio pagou o tratamento depois que Mary Stela fez a funcionária refém.

A unidade diz que duas sessões de quimioterapia não foram pagas.

O advogado do plano afirmou ainda que existe uma pendência judicial que vai definir a necessidade de coberturas por parte do plano, mas que cumpre a liminar. Ele destacou que a empresa poderia ter rescindido o contrato com o cliente quando ele ficou inadimplente, mas não o fez.

Segundo o plano, já foram gastos, até agora, R$ 171 mil para tratar Ronaldo.

O advogado afirmou que o atendimento ao paciente será mantido desde que haja prescrição médica e que Mary Stela será processada civil e criminalmente, por ameaça e cárcere privado.

Ele disse ainda que o plano descredenciou hospitais sem descumprir a lei.

Luiza Bandeira, FolhaPress

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