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Moradora: "Havia um corpo no telhado, que veio com a enxurrada"

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“Eu estava na estrada Teresópolis-Petrópolis (BR-495), quando fui parada. Pediram para eu avisar a polícia que havia o corpo de um rapaz no telhado de uma das casas. Ele veio na enxurrada. Como o rio subiu muito, a água ultrapassou o telhado”. 
A cena, difícil de visualizar, foi presenciada pela comerciante Heloísa Bentes na última quarta-feira (12) e é apenas mais uma entre as muitas histórias da tragédia que tomou conta da região Serrana do Rio de Janeiro. Até agora, mais de 380 mortes foram registradas em Friburgo, Teresópolis e Petrópolis. 
“Totalmente caótica”, “muito catastrófica”, são os adjetivos usados por moradores de um condomínio no distrito de Petrópolis. O que antes era mais frequente nas periferia, abateu a classe média. “Estou sem luz, sem telefone, sem celular, sem nada, inclusive sem água. Minha vizinha perdeu tudo o que tinha no primeiro andar na casa dela. As casas do outro lado da rua ficaram com 2,2 metros de água e barro”, relata a advogada Miriam Przewodowska (49). 

Situação semelhante foi relatada por Heloísa Bentes. “Desta vez, foram atingidas casas de pessoas de baixa renda, casas de pessoas de alta renda. O vale acabou. Estão dizendo que não sobrou nada”. Segundo ela, moradores relataram que o nível do rio Santo Antônio subiu rapidamente, surpreendendo a todos. “Ele veio arrastando tudo. As pessoas foram para as lajes. Você vê no meio do caminho TVs, carros capotados”.

“A situação na região do Vale do Cuiabá (Distrito de Itaipava, uma das regiões mais afetadas) está bem triste. Ali é a ligação com Teresópolis. Encontramos muita gente fazendo limpeza das casas, que foram cobertas até o telhado”, conta Heloísa. A pousada Tambo Los Incas, que fica no Vale, está entre os imóveis atingidos. No site do estabelecimento, há um comunicado, informando aos clientes que a pousada não terá condições de atender aos hóspedes por um “longo período de tempo”.
Sem condições de habitar sua própria casa no Vale da Lua (também no Distrito Itaipava), Miriam toma banho na da cunhada desde o começo das enchentes. “Isso já havia acontecido em 2008, mas não foi tão forte. Na ocasião, o nível da água em casa chegou só a um metro e meio”, conta.
 
“Corrida de lama”
O arquiteto e urbanista Nabil Bonduki afirma que não existe nenhum tipo de casa capaz de resistir à “corrida de lama”, deslizamento raro visto apenas em dias de forte chuva. Mestre e doutor em Estruturas Ambientais Urbanas, Bonduki explica: 
– Existem as estruturas de rocha e a cobertura vegetal que está sobre ela. Na medida em que acumula cobertura vegetal, ela despenca. Para esses lugares serem habitáveis, as estruturas das casas precisariam de uma profundidade que chegasse até a rocha, o que, na minha avaliação, é muito difícil de acontecer. Não podem viabilizar essas regiões como alternativa habitacional.
O urbanista chama a atenção também para a ocupação turística dessas áreas. Para ele, casas de veraneio, hotéis e pousadas muitas vezes estão em locais perigosos e é preciso fazer o mapeamento para impedir a ocupação. 
“Seriam necessários instrumentos mais fortes de política fundiária”, diz Bonduki, para depois acrescentar que “a propriedade privada da terra regida por especulação multiplica esse tipo de situação”. 

Ginásio em Teresópolis recebe desabrigados
 
“SOS Teresópolis”
De acordo com a Secretaria de Desenvolvimento Social de Teresópolis – uma das mais prejudicadas -, são cerca de mil desabrigados espalhados por escolas e igrejas do município. A maioria está concentrada no Ginásio Pedro Jahara (Pedrão), para onde são encaminhados os donativos. Os itens mais necessários no momento, conforme a secretaria, são água potável, roupas, alimentos, artigos de higiene pessoal, mamadeiras e leite.
A prefeitura de Teresópolis disponibilizou uma conta corrente no Banco do Brasil para receber doações e ajudar as famílias atingidas pelo temporal. Com o nome “SOS Teresópolis – Donativos”, ela está disponível na agência 0741-2 do Banco do Brasil, com o número 110000-9.
Terra Magazine