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Censo e religião: algumas interrogações

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Em tempos de tolerância religiosa e pluralidade, parece justo epositivo que o Censo 2010 ofereça 17 opções de resposta para apergunta: Qual a sua religião? Na verdade, 18 se contarmos aqueles quenão se auto-identificam com nenhuma pertença.
 
O dado permite constatar não só a existência de uma diversidadeimensa na pertença religiosa brasileira, como a sadia convivência entreas diversas confissões, reconhecida pelo censo. No entanto, algunsmatizes na maneira como foi elaborado o questionário permitem perceberque não há tanta neutralidade na proposta do censo.
 
Existem dois questionários: o “básico” e o “da amostra”. No básiconão existe a pergunta – “Qual é a sua religião ou culto?” – presente nooutro, que será aplicado apenas em um número reduzido de domicílios, naproporção de um para cada dez. A religião será, portanto, informada poramostragem.
 
Porém, há outros detalhes que dizem respeito sobretudo aocristianismo histórico, religião que ainda congrega a maioria do povobrasileiro. O recenseado será colocado diante de uma lista de 27 opçõese subdivisões da religião católica. O cardeal arcebispo de São Paulo,Dom Odilo Scherer, aponta aí uma distorção: das 27 alternativas pelomenos 12, ou seja, quase a metade não é de outras igrejas, confissõesou religiões, mas de grupos e associações que existem dentro daconfissão católica romana.
 
A Igreja Evangélica de Confissão Luterana, uma das mais importantesdenominações protestantes históricas, que representa três quartos dosluteranos brasileiros, se queixa de haver sido excluída das opções docenso. Em meio a 48 designações com o termo “luterano”, não se encontraa IECLB.
 
Em entrevista, o pastor presidente Walter Altmann diz que tomouconhecimento da exclusão através de fiéis de sua Igreja, que, aoreceber os recenseadores, constatavam confusos que a única sugestãoespecífica quanto a luteranos empregava a expressão “luteranopentecostal”, designação que nenhum luterano emprega ou reconhece parasi.
 
Tanto o cardeal quanto o pastor se preocupam com a confusão que já estágerando entre os fiéis de uma e outra igreja. Os subgrupos internos àorganização da Igreja Católica não são “outras” confissões, mas amesma, na expressão de seus diversos carismas, agremiações, associaçõese movimentos. Há aí uma imprecisão grave não só pelo erro explícito queapresenta, mas pela confusão que pode causar. Reconhecer e apresentarmais de 40 denominações protestantes, sem mencionar aquela que agrupatrês quartos dos fiéis existentes no país é uma aberração. “E maisainda ao colocar lado a lado as palavras “luterano” e “pentecostal”.Quem tem um mínimo conhecimento do protestantismo sabe que o movimentopentecostal difere bastante da corrente histórica, não sendo as duasexpressões intercambiáveis.
 
É muito positivo que todas as pertenças religiosas do nosso paísapareçam no censo, de maneira que todas as pessoas se encontremcontempladas na medida do possível, mas parece nebulosa a questão docristianismo histórico devido à maneira como são formuladas asperguntas.  
 
A importância do censo é inegável, porém o quesito religião deixamuito a desejar em termos de clareza e precisão. É compreensível,portanto, que o cardeal e o pastor, responsáveis pelas igrejas emquestão, estejam empenhados em esclarecer o povo quanto a isso. Pois,com tal distorção, o dado corre o risco de ser deturpado e uma parte docenso perde seu objetivo e sua razão de ser, que é apresentar umaradiografia o mais exata possível do povo brasileiro. 
Maria Clara Lucchetti Bingemer