Eric Gil Dantas
Colunista
Economia 23/Set/2016 às 09:40 COMENTÁRIOS
Economia

Por que sou contra a reforma da Previdência?

Eric Gil Dantas Eric Gil Dantas
Publicado em 23 Set, 2016 às 09h40
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Eric Gil*, Pragmatismo Político

Em qualquer grande jornal que você for ler ou assistir, hoje, verá o discurso estampado: a reforma da Previdência é urgente, se não o fizer o país quebrará. Este tem sido também o discurso do governo Temer, e em certa medida também do governo Dilma anteriormente (este com um pouco mais de resistência).

No entanto, apesar de tanto alarmismo, o governo e os grandes jornais se utilizam de um discurso falso para justificar a reforma da Previdência, o de que existe um déficit nas contas deste órgão, o famoso “Rombo da Previdência”. Mas por que isto é mentira?

Quando falamos sobre Previdência Social temos que contextualizá-la em um sistema maior, a qual está inclusa, a da Seguridade Social. A Constituição Federal define em seu artigo 194 que “a Seguridade Social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social”, e é formada pela Previdência Social, Saúde Pública e Assistência Social.

Para assegurar o funcionamento desta área, algumas receitas públicas são vinculadas diretamente à Seguridade. Este não é o caso apenas da arrecadação previdenciária, entre patrões e empregados, mas também pelo Estado (a partir de mais fontes de receita), formando um sistema tripartite. Além das arrecadações diretamente previdenciárias (tanto urbana quanto rural) também constam como fonte de receita a Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (COFINS), a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), o Programa de Integração Social (PIS) e o Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público (PASEP) e receitas provenientes dos concursos prognósticos (que são sorteios do tipo loteria), além de recursos das próprias entidades.

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Fonte: SIAFI; MPS; ANFIP. Elaboração: ANFIP

Como podemos ver no gráfico, o sistema da Seguridade Social manteve-se no azul em todo o período exibido de 2008 a 2014 (dois trabalhos famosos por fazerem o recálculo das contas da Seguridade Social são a tese da professora do Instituto de Economia da UFRJ, Denise Gentil, e as publicações anuais da Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil – a qual optamos por reproduzir aqui por ter números mais atualizados, até 2014), variando entre superávits de R$ 32,89 bilhões em 2009 e R$ 82,7 bilhões em 2012.

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O cálculo correto (utilizando todas as fontes de receita constitucionalmente definidas para financiar Previdência, Saúde e Assistência Social) desautoriza os ideólogos da reforma previdenciária a dizer que existe o “rombo da Previdência”. Na verdade, o sistema que está inserido o órgão responsável pelo pagamento das aposentadorias, pensões, auxílios e outros benefícios recebe mais do que gasta, ou seja, a Seguridade Social goza sim de superávit ao menos até 2014, último cálculo feito pela ANFIP.

Mas por que a mídia e o governo insistem em dizer que existe um rombo? Eles desconsideram que existem contribuições sociais que servem justamente para o financiamento disto, e contam apenas com as receitas provenientes do pagamento por parte do trabalhador e do empregador. No entanto, quando uma receita se torna vinculada, ela necessariamente deve ser gasta na área. Por exemplo, o dinheiro que se arrecada com a CSLL deve ir necessariamente para gastos da Seguridade, e não para financiar pagamento com juros da dívida pública. O objetivo desta mistificação é ludibriar a população para acreditarem que a Previdência deve ser “reformada” e mesmo substituída pelos fundos privados, indo inclusive de encontro à Constituição que prevê a existência de uma contabilidade exclusiva para a Seguridade Social, que mostraria não haver déficit algum – para enganar os trabalhadores e convencê-los que suas aposentadorias são o problema vale até ir de encontro ao que está na lei.

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Junto à isto a Desvinculação das Receitas da União (DRU), que esteve em vigor de 1994 até dezembro de 2015 e voltou há poucos meses, permite desvincular 30% (até ano passado o valor era de 20%) destas receitas para gastar com o que quiserem. Isto é o que possibilita o Governo pegar dinheiro que necessariamente financiaria a Previdência Social, a Assistência Social e a Saúde Pública e jogar na conta de pagamento de juros da dívida. Logo, além de superavitária, ainda tem seu dinheiro desviado para jorrar nas gordas contas dos banqueiros.

Por fim, o Governo Federal ignora que aumentou em 136% as desonerações da Previdência Social, principalmente a partir do Plano Brasil Maior, que permitiu o não pagamento da contribuição previdenciária patronal para diversos setores. Como esperar que o Governo Federal abra mão de mais de 44 bilhões de reais (a diferença das desonerações dadas antes do início da implementação da política de desonerações da Dilma, em 2010, até o seu ápice, em 2015 – o que pode ser visualizado no gráfico) e não ter efeito algum no dinheiro destinado à aposentadoria dos trabalhadores?

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Fonte: Receita Federal

Além de tudo isto, a Previdência Social brasileira é uma forte política de distribuição de renda, tanto na cidade quanto no campo. Caso consigam o desmonte desta conquista da população, viveremos um grande retrocesso social, com uma maior concentração de renda e empobrecimento ainda maior dos que mais precisam. Por isto que eu digo, sim, é urgente o combate à esta reforma previdenciária.

*Eric Gil é economista formado pela Universidade Federal da Paraíba, mestre e doutorando em Ciência Política pela Universidade Federal do Paraná; escreve quinzenalmente para Pragmatismo Político

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