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Democratização Comunicação 15/Jan/2015 às 12:35 COMENTÁRIOS
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Uma razão para a regulamentação (democratização) da mídia no Brasil

Publicado em 15 Jan, 2015 às 12h35

A questão da linguagem está no centro da polêmica sobre regulamentação da mídia – que costuma ser confundida com liberdade de expressão ou liberdade de imprensa. A regulamentação não tem relação direta com as liberdades fundamentais da produção. Essa confusão reducionista serve apenas para impedir a evolução do debate.

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Uma razão para a regulamentação (democratização) da mídia no Brasil (Imagem: Pragmatismo Político)

A linguagem jornalística é um campo instigante para a curiosidade dos pesquisadores. Pode-se abrir um leque de incalculáveis possibilidades de interpretação, a começar da própria convenção segundo a qual existe uma linguagem específica do jornalismo. Se a definição do que seja jornalismo ou de quais qualidades caracterizam o jornalista se dilui no ambiente social hipermediado, como delimitar padrões para uma linguagem específica dessa atividade?

Observe-se, por exemplo, que até a primeira metade do século 20, em todas as sociedades onde a imprensa tinha um papel relevante, a chamada linguagem jornalística obedecia à norma culta dos idiomas e as imagens tinham que cumprir certos requisitos de pudor para serem levadas aos meios massivos de publicação. O padrão mudou quando a cultura “pop” se impôs sobre a comunicação social, mas certas restrições permaneceram.

Jornais e revistas não estampariam, por exemplo, o quadro intitulado “A Origem do Mundo”, pintado por Gustave Courbet em 1866. Nesta segunda década do século 21, também não se expõe a pintura, a não ser em publicações especializadas e de pequena circulação. Em fevereiro de 2013, a imprensa aproveitou uma polêmica sobre a identidade da mulher que teria servido de modelo para a obra e publicou a imagem. Meses antes, em outubro de 2012, o jornal Folha da Manhã, de Campos dos Goytacazes (RJ), havia estampado uma foto ainda mais explícita na primeira página de seu caderno de Cultura e Lazer. É curioso observar que o pudor jornalístico se manifesta mais fortemente na imagem do que na palavra.

Leia também: Quem tem medo da regulamentação da mídia no Brasil?

A internet rompeu paradigmas da mídia impressa e da televisão em todo o mundo. No Brasil, os abusos eram prática limitada a certos programas radiofônicos ou televisivos dedicados ao noticiário policial, até o advento dos cronistas “pitbulls”, que reproduzem em larga escala o estilo que marcou polemistas como Carlos Lacerda e Paulo Francis. Cabe a eles romper, para baixo, os padrões da linguagem jornalística, vocalizando a pornografia política que os editoriais não ousam proferir.

A síntese em uma charge

A questão da linguagem está no centro da polêmica sobre regulamentação da mídia – que costuma ser confundida com liberdade de expressão ou liberdade de imprensa, temas apenas correlatos. A regulamentação dos meios de comunicação não tem necessariamente uma relação direta com as liberdades fundamentais da produção e usufruto de informações ou opiniões. Essa confusão reducionista serve apenas para impedir a evolução do debate.

Os supostos abusos contra o que seria a linguagem jornalística têm sido usados como argumento por aqueles que defendem a regulamentação e, em casos extremos, o controle externo da mídia. No entanto, é preciso dar um passo atrás e convencionar se ainda existe uma linguagem jornalística e, se existe, quais seriam seus padrões.

Desde a origem, trata-se de uma questão complexa, uma vez que a própria escolha dos signos que irão representar os argumentos define o que cada um entende como linguagem mais apropriada para a prática do jornalismo. Supunha-se, portanto, que o tema da regulamentação dos meios aplicados ao jornalismo exigiria um tratado complexo como o que resume, por exemplo, os argumentos sobre a natureza antropogênica das mudanças climáticas.

Até terça-feira (6/1): na página 2 da Folha de S. Paulo, o cartunista Laerte Coutinho resume, numa charge, o núcleo da questão, ao propor em dez pequenos quadros, os “10 motivos para uma regulamentação da mídia”.

A questão aparece retratada em uma manchete de jornal, uma bancada de telejornal, uma página de revista, uma análise de um cientista político, um cartaz de campanha, um debate na televisão, uma pesquisa, um programa de rádio, uma entrevista e um site noticioso. Em todos eles, a mesma resposta: “O governo quer controlar a opinião pública”.

Em seu admirável poder de síntese e carregando uma ironia irresistível, o cartunista demonstra que a homogeneidade do discurso da mídia contra a regulamentação é o maior argumento em favor da regulamentação.

Ele não entra em detalhes, como os que costumam embaralhar os debates: apenas mostra que, sem diversidade, a mídia simplesmente não cumpre seu papel social.

Luciano Martins Costa, Observatório da Imprensa

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