Luis Soares
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Mundo 31/Jan/2013 às 19:25 COMENTÁRIOS
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As gafes de Taro Aso, ministro que sugeriu a morte de idosos

Luis Soares Luis Soares
Publicado em 31 Jan, 2013 às 19h25

Taro Aso: as gafes do ministro japonês que sugeriu morte de idosos. Fala do político se insere em quadro populacional grave para o país, com crescimento da porcentagem dos idosos

Taro Aso é ministro das Finanças do Japão e senhor de uma longa e política história. Ele ficou mais conhecido, porém, nesta semana, depois que insultou os mais de 30 milhões de japoneses acima de 60 anos ao dizer em público que “o problema [para o alto gasto com despesas médicas para idosos] só vai se resolver se os deixarmos morrer logo”.

A frase, pronunciada na última semana durante reunião do Conselho Nacional sobre reformas de segurança social, partiu de um político de 72 anos que escreveu uma carta instruindo a família a não lhe oferecer tratamentos médicos que prolongassem sua vida.

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Taro Aso afirmou que problema das despesas médicas com idosos só se resolverá quando todos morrerem. (Foto: Divulgação)

Isso, aliás, é um pecado para Aso: “Que Deus proíba que vocês sejam forçados a viver quando querem morrer. Eu acordaria me sentindo incrivelmente mal ao saber que o tratamento estivesse sendo pago pelo governo“, disse na mesma reunião. Ele se referiu a pacientes que não conseguem se alimentar por contra própria, como “pessoas entubadas“, e adicionou que o Ministério de Saúde e Bem Estar estava “bem consciente do custo de dezenas de milhares de yenes“ por mês para tratar um único paciente nos últimos estágios de vida.

A gafe de Aso é somente a última de uma lista que inclui suas pronúncias erradas de japonês em 2008 (quando “hinpan“, que significa ‘frequente, foi lido como “hanzatsu“, ‘complicado’) e suas aspirações como ministro da Economia em 2001 de fazer do Japão um lugar “onde os judeus mais ricos gostariam de viver”.

Além disso, acrescente sua conversa como ministro de Relações Exteriores com diplomatas norte-americanos em que disse que eles nunca teriam a confiança nas negociações de paz no Oriente Médio porque tinham “olhos azuis e cabelo loiro“.

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Após a fala sobre os idosos, Aso reconheceu que sua linguagem havia sido inadequada para um fórum público e insistiu que estava falando somente a partir de suas opiniões: “Eu disse o que pessoalmente acredito, não como o tratamento para o fim da vida deve ser“.

A questão da fala mais recente de Aso, na verdade, tem dois lados: por um, o envelhecimento populacional do Japão é uma das maiores dificuldades que as gerações atual e futuras terão que enfrentar. Por outro, Aso não é somente mais um idoso na fila dos milhões na Terra do Sol Nascente, mas um personagem com vínculos privilegiados e, certamente, nenhuma preocupação sobre como irá pagar por sua saúde de agora em diante.

Vida e obra de Taro Aso

Tataraneto de Toshimichi Okubo, figura importante durante a Restauração Meiji, no fim do século 19; neto de Shigeru Yoshida, primeiro-ministro pós Segunda Guerra Mundial; bisneto e filho de parlamentares; casado com Chikako, filha de outro ex-premiê e irmão da mulher do primo do atual Emperador Akihito. Aso não tem poucas ligações poderosas.

Na década de 1970, foi presidente da Aso Cement, sucessora da Aso Mining, conglomerado familiar que já incluiu banco e mineradora de carvão e hoje agrupa 70 companhias, de hospitais a universidades.

Atualmente gerida por seu irmão e chamada de Aso Group, a então Aso Mining foi acusada em 2006 de impor trabalho forçado em minas de carvão a 300 prisioneiros da Segunda Guerra e a 10 mil coreanos na cidade de Kyushu. Taro Aso diz que tinha 5 anos de idade quando a guerra acabou e, de qualquer modo, a empresa era outra naquela época.

Além de ministro das Finanças, o político também é vice-primeiro ministro e chefe da Agência de Serviços Financeiros. No passado, foi primeiro-ministro, chanceler e ministro de Assuntos Domésticos.

Inclusive, foi o fim de seu cargo como premiê, em 2009, que marcou a derrota do PLD (Partido Liberal Democrático) após 54 anos no poder pelo PDJ (Partido Democrático do Japão), liderado por Yoshihiko Noda. O PLD já voltou ao poder, em dezembro de 2012, com Shinzo Abe como o sétimo premiê em seis anos.

Agora com Abe no poder, a administração concordou neste mês com um orçamento extra de US$147 bilhões para injetar gastos públicos e estimular a economia – menor somente que os US$ 157 bilhões aprovados por Aso durante seu último ano como primeiro-ministro, para enfrentar a crise econômica mundial.

A ação de Aso não surpreende se for considerado o que ele escreveu em seu livro As lições que o avô Shigeru Yoshida nos ensinou: “Quando você achar necessário gastar dinheiro, então vá em frente e pegue uma soma enorme, não hesite em usá-la“. O avô não pensou duas vezes em pegar empréstimos dos EUA depois da Segunda Guerra – e, somente descontando os EUA, assim fez Aso enquanto presidente da Aso Cement. O gasto com idosos doentes, porém, parece não fazer parte do rol de despesas públicas com que Aso se preocupa.

Terceira idade

A pirâmide populacional do Japão há muito tem a aparência de um losango: muito mais idosos para muito menos gente jovem. A rapidez com que a população envelhece é a maior entre os países desenvolvidos e o pico populacional observado em 2005 deve ser o último: é esperado que, dos 126 milhões de japoneses hoje, restem apenas 87 milhões até 2060. A maior queda anual foi em 2012, quando o número de habitantes caiu 212 mil e apenas 1,03 milhão nasceram. Desde 1975, a média de filhos por mulher é menor que dois.

Além disso, a população aposentada deve passar dos atuais 23% para 40%, enquanto a faixa etária apta a trabalhar, entre 15 e 56 anos, deve cair pela metade. A expectativa de vida deve crescer mais de quatro anos (84 anos para homens e 91 para mulheres). As informações são do Instituto Nacional de Pesquisa sobre População e Segurança Social.

E tudo isso representa um custo significante para o governo. Segundo artigo de Hiroshi Yoshikawa, professor de Economia na Universidade de Tóquio, enquanto todos os gastos públicos têm sido sistematicamente reduzidos na última década, programas de segurança social aumentaram US$12,7 bilhões por ano. Isso em um país com 200% de déficit público em relação ao PIB (Produto Interno Bruto), a maior entre os países desenvolvidos. Em 2050, cada pessoa trabalhando deverá sustentar um aposentado.

O resultado é um país com cada vez mais gente idosa, mais gastos médicos públicos e menos pessoas que possam contribuir para isso. Para Yoshikawa, a solução está em aumentar os impostos e adaptar a segurança social para a sociedade envelhecida. Resta ver o que o governo de Shinzo Abe e Taro Aso planejam para 2013, cujo orçamento deve sofrer um corte de gastos em abril.

Mercado do presente e do futuro

Mesmo representando um grande gasto público, o idosos também compram. 44% do consumo nacional veio de pessoas com mais de 60 anos no ano anterior a março de 2012, um gasto maior do que qualquer outra faixa etária, segundo cálculos da Aeon, maior rede varejista na Ásia. A corrida para abocanhar a maior parte dos US$1,4 trilhão que eles gastaram está aberta.

“Conforme a sociedade envelhece, idosos estão reavaliando lojas como as de conveniência, que vendem pacotes pequenos. Eles compram as coisas mesmo que sejam mais caras, eles são o grupo com poder financeiro“, diz Naoki Fujiwara, gerente de fundos da rede Shinkin.

A venda de fraldas geriátricas da maior fabricante do país, Unicharm, excedeu a de fraldas para bebês pela primeira vez em 2011. Segundo o CEO Takahisa Takahara, a lição deve servir para expandir os negócios na China, onde os idosos cresceram e representaram quase 9% da população total em 2012, fenômeno para o qual a política do filho único contribui.

As estratégias de empresas para atrair esse público em específico vão desde diminuir a velocidade de elevadores e fornecer carrinhos de supermercado mais leves, até dar cartões de 5% de desconto aosclientes com mais de 65 anos que pagarem suas pensões, tática da Seven Eleven.

Opera Mundi, com de The Guardian, Bloomberg, The Japan Times e BBC

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