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Mídia desonesta 25/Fev/2012 às 16:06 COMENTÁRIOS
Mídia desonesta

Para Boris Casoy, Lula é culpado pela morte da ex-dona da Daslu

Publicado em 25 Fev, 2012 às 16h06

Segundo o âncora da Band, “Eliana Tranchesi foi exposta à execração pública e humilhada”. O sujeito parece entender que tudo aconteceu só por ela ter sonegado algumas centenas de milhões de reais em um esquema que o Ministério Público chamou de “organização criminosa” e que gerou multa de R$1 bilhão, além da ação penal

Eduardo Guimarães, do Blog Cidadania. Via Limpinho & Cheiroso

Ao comentar o passamento da antiga dona da mega butique de luxo Daslu, Eliana Tranchesi, na madrugada da sexta-feira, dia 24, o apresentador do Jornal da Noite (TV Bandeirantes), Boris Casoy, lançou uma teoria no mínimo inédita: ela teria falecido por culpa do governo Lula, que, em 2005, teria engendrado a Operação Narciso, da Polícia Federal, apenas para desviar o foco do escândalo do mensalão.

Veja, abaixo, o vídeo enviado pelo leitor Evandro. Em seguida, continuo comentando.

Agentes da Polícia Federal (PF), do Ministério Público Federal e da Receita Federal fizeram uma busca na sede da Daslu, naquele ano, para coleta de provas de que a empresa estava envolvida em crimes de sonegação fiscal e contrabando, os quais acabaram sendo comprovados, gerando a Tranchesi pena de prisão de 94 anos, pena que ela jamais sequer começou a cumprir devido à Justiça ter ficado tocada pelo seu estado de saúde.

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A tese de Casoy é bastante curiosa. Apesar de a Operação Narciso ter sido levada a cabo, simultaneamente, em São Paulo, Santa Catarina, Paraná e Espírito Santo, de a Justiça ter autorizado a operação, de o Ministério Público ter descoberto o esquema e de a Polícia Federal ter feito mais de mil operações durante o governo Lula, a pobre Tranchesi, que após seu falecimento vem sendo tratada pela mídia como uma espécie de Che Guevara capitalista, teria falecido por uma ação policial que ocorreu há sete anos.

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A menos, é claro, que Casoy considere que ela faleceu pelo processo criminal todo que enfrentou e não apenas pela operação de 17 de julho de 2005, e que não deveria nem ter sido processada criminalmente pelos crimes que cometeu…

O âncora do telejornal da TV Bandeirantes, assim como quase todos os outros colunistas, articulistas e editorialistas da grande imprensa, sempre disseram “exagerada” a operação que envolveu 250 policiais federais, apesar de a sede da Daslu, então, ser um prédio de quatro andares e 17 mil metros quadrados, que, pelo tamanho, permitiria que provas fossem tiradas de lá se não tivesse sido cercado e ocupado de surpresa.

Aliás, vale um registro: o uso de 250 policiais na Operação Narciso e a prisão, por alguns dias, da dona da mega butique de luxo foram considerados “truculência” pelos mesmos colunistas, articulistas e editorialistas – entre os quais o próprio Casoy – que consideraram absolutamente normal o uso de 2 mil policiais militares para desocupar o bairro do Pinheirinho, em São José dos Campos, e que, ali, não enxergaram truculência.

O tratamento VIP dado pela mídia tucana à dona da Daslu pode ser compreendido por meio da foto abaixo.

Eliana Tanchesi Alckmin Daslu

Eliana Tranchesi, Geraldo Alckmin e a esposa na inauguração da Daslu

A Operação Narciso, naquele 2005, gerou indignação na imprensa e não foi devido à fartura de provas que condenou Eliana Tranchesi a quase 100 anos de prisão, com localização de notas de entrada de mercadorias importadas nas quais vestidos de R$10 mil haviam sido registrados pelo valor singelo de R$100,00.

A explicação para a indignação midiática, pois, reside no fato de que a filha do governador de São Paulo, Geraldo Alckmin – que, à época, também era governador –, trabalhava na Daslu quando suas operações criminosas foram descobertas. Ela iniciara no trabalho havia pouco tempo como uma das vendedoras da empresa que ficaram conhecidas como “dasluzetes” e pouco depois foi promovida a “diretora de novos negócios”.

Estranhamente, a Secretaria da Fazenda de São Paulo não notou nada de estranho nas operações da Daslu, apesar de que suas operações eram tão escandalosas, com suas notas de entrada com preços populares, que a Polícia Federal chegara à empresa, em 2005, sabendo exatamente o que procurar, o que a obrigou a montar uma operação ampla para evitar que sumissem com as provas.

Segundo o âncora da Band, “Eliana Tranchesi foi exposta à execração pública e humilhada”. Veja só, leitor, que esse sujeito parece entender que tudo aconteceu só por ela ter sonegado algumas centenas de milhões de reais em um esquema que o Ministério Público chamou de “organização criminosa” e que gerou multa de R$1 bilhão, além da ação penal. Chega a parecer que, pelos crimes cometidos, deveriam ter feito uma estátua para Tranchesi.

O comentário de Casoy não contém indignação com a ilegalidade, à diferença da indignação contra as famílias do Pinheirinho. No caso da ricaça, o jornalista mostrou compaixão e indignação por ela ter falecido por desgostos que a descoberta de suas operações ilegais lhe causou, o que, no limite, talvez possa ser verdade, mas não muda o fato de que a culpa foi de quem montou o esquema criminoso, e de mais ninguém.

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