Luis Soares
Colunista
Política 17/Dez/2010 às 17:36 COMENTÁRIOS
Política

O que está por trás da escolha do “homem do ano”

Luis Soares Luis Soares
Publicado em 17 Dez, 2010 às 17h36
Realmente os tempos mudaram. Os dois principais candidatos ao título de Homem do Ano da revista norte-americana Time têm menos de 40 anos e alcançaram notoriedade mundial pelo que fizeram na internet.  Mark Zuckerberg, o criador da rede social Facebook superou Julian Assange, do site Wikileaks, mostrando que a web não é mais apenas um item no nosso cotidiano, mas o eixo de uma nova forma de viver.
Zuckerberg conseguiu o inédito feito de reunir meio bilhão de pessoas, mais de duas vezes a população brasileira, em torno de uma rede de relacionamentos pela internet. Assange, estava na lista do nomes favoritos, mas não foi escolhido pela Time porque  é o ícone de um desafio inédito às grandes potências mundiais, cujos segredos estão sendo desvendados por uma página na web.

A internet está deixando de ser uma curiosidade tecnológica ou o objeto de desejo dos fascinados por novidades e quinquilharias eletrônicas, para começar a mostrar a sua verdadeira cara.  Os criadores do Facebook e do Wikileaks são apenas a personificação de um processo mais profundo que é o da mudança das regras que orientam nosso convívio social, as relações econômicas, os padrões culturais e até mesmo a nossa participação política.

É importante dar-se conta de tudo isso porque as mudanças já estão acontecendo e muitas pessoas e instituições  estão sendo atropeladas pela nova conjuntura.  Zuckerberg e Assange não se tornaram personalidades mundiais apenas pelas suas virtudes pessoais.  Na verdade, eles são figuras absolutamente comuns.  A diferença está no contexto e na natureza imprevisível do processo deflagrado pela internet e pela web.
Da mesma forma que a descoberta da imprensa e o surgimento da produção industrial mudaram a cara no mundo, estamos agora começam a assistir e participar do surgimento de uma nova era. E como toda coisa nova, ela é incerta, imprevisível e ameaçadora para muitos. As reações ao desafio proposto pelo Wikileaks mostram a intensidade do temor de governos, empresas e organizações que construíram sua cultura sobre o controle da informação.
O Facebook cresceu porque ao contrário das demais redes concorrentes, como a MySpace,  conseguiu desenvolver entre os seus usuários a sensação de que eles eram os donos do espaço onde trocavam mensagens e informações. Mas nas quatro vezes em que  Zuckerberg tentou mudar as regras para ampliar a publicidade e ganhar mais dinheiro, ele acabou tendo recuar devido ao temor de protestos e de uma fuga em massa de clientes.
O homem do ano da revista Time também está no centro de uma polêmica sobre direitos autorais que ainda não foi resolvida. O caso criado com colegas de universidade e com seu ex-sócio, o brasileiro Eduardo Saverin, foi abafado por um acordo financeiro, mas a discussão sobre quem é o dono da idéia da Facebook ainda continua e não vai terminar tão cedo.
É que a internet está abalando toda a estrutura de negócios criada em torno da posse de direitos autorais, uma estrutura concebida quando as idéias eram muito mais escassas porque o fluxo mundial de informações era concentrado e pouco intenso.  As dimensões reduzidas do processo permitiam o controle sobre as novidades, mas agora, com a avalancha informativa, não é mais possível diferenciar uma idéia de outras, tudo passou a ser um processo.
Não é por acaso que a personalidade de 2010 tem 26 anos, uma idade em que a maioria dos jovens está saindo da universidade e começando a tentar achar um lugar no mercado de trabalho. Zuckerberg já é um bilionário, mas sua fortuna pode virar fumaça em questão de dias caso surja uma novidade ainda mais fascinante. O ritmo frenético da inovação e a imprevisibilidade do mercado criam condições para que personagens improváveis nas regras atuais tornem-se personalidades mundiais.
Quando a rede Facebook surgiu, o mercado era dominado pela MySpace, que começou a cair quando foi comprada pelo megaempresário Rupert Murdoch, que viu cifrões e não expectativas de usuários ao fechar o negócio. 
A incerteza e mudança constante são padrões novos em ascensão contrastando com nossa formação onde a estabilidade, segurança e previsibilidade são valores ainda considerados essenciais.  É difícil saber se a Time levou em conta todos estes fatores ao escolher Zuckerberg para a sua capa da edição de fim de ano.  Mais provavelmente a revista está mais preocupada com a popularidade do criador do Facebook, num momento em que Assange e seu Wikileaks são muito mais ameaçadores para os padrões vigentes. 
Carlos Castilho

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